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Nem sempre sou quem escrevo, mas sempre sou quem escreve.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

A queimadura da mão esquerda (20 anos)

Será que somos tão adultos, mas tão adultos, a ponto de olhar pra trás e não perceber quem fomos?

Sério, a minha eterna dúvida é se essas crianças mais novas tem alguma semelhança com quem fui. Talvez seja uma crise minha, dos (irrisórios) vinte anos, mas é algo que não dá pra ignorar. Ontem mesmo vi uma molecada correndo e implicando com as meninas. Quando perguntei alguém sobre a idade daquele pessoal, recebi a notícia: dezoito anos. "Será que eu era assim nessa idade, tão imaturo?" Foi a pergunta que eu fiz a mim mesmo.  Mas na verdade, a pergunta que eu deveria ter feito era se daqui a dois anos não vou me encucar com a mesma questão.

Quando eu tinha dezoito, fiquei meio tonto de cerveja - não julgue meus dezoito anos! - e queimei minha mão enquanto ia fazer uma lasanha. Foi uma cena esquisita, salvei-a de ser cômica só porque ninguém viu, eu estava sozinho. Pus a mão pra pegar a lasanha e o lado de fora dela encostou numa parte do forno, e aí rolou aquela típica dança da chuva na qual você abana a sua mão enquanto dá pequenos saltinhos esperando realmente que aquilo alivie a sua dor. A queimadura fez uma marca, que desapareceria em breve.

Será que a gente é tão jovem, mas tão jovem, que a gente não percebe quem a gente tá virando?

Porque eu lembro que quando eu tinha uns nove, dez anos tinha um rapaz da igreja que estava fazendo festa de aniversário depois do culto, e a sua idade, no bolo: dezoito anos. Já ia tirar a carteira, ia comprar um carro, já estava na faculdade! Faculdade, juro, coisa de gente grande mesmo. Pra mim, com dez, dezoito era a idade da vida, era a liberdade, a época em que os seus pais deixariam você fazer tudo.

Uma vez, quando fiz três anos, perguntei a minha mãe na véspera do meu aniversário se no próximo dia eu iria crescer. Essa história é motivo de risada, pensamento de criança, ingenuidade. Mas o pensamento persistiu, porque quando eu fiz dezoito, um dia antes a minha esperança era a mesmíssima: amanhã seria alguém livre, alguém dono de si, todo adulto. Ia até poder comprar revista de mulher pelada, se quisesse. Eu tirei carteira um ano depois, com dezenove. Eu não comprei nenhuma playboy. Eu não tinha um carro. A faculdade nem era tão bacana assim e minha mãe não dormia até eu chegar em casa: o horário pra chegar era, pasmem, onze e meia. Eu ainda tinha três anos!

Hoje eu olho pra minha mão esquerda e pros meus vinte anos. Eu ainda tenho três, ainda tenho quinze, ainda tenho dezoito. A prova disso é que a marca do forno, que eu achei que ia desaparecer, permanece. E agora creio eu que ela ficará aqui a vida toda, um risco escuro que me remete à uma "imaturidade". Talvez ela cumpra a função de lembrar que a gente não muda de idade, a gente acumula. Faço vinte anos na esperança de que tudo mude. Quem sabe dessa vez, no virar do dia? A felicidade  mora em saber que simplesmente percebemos o mundo de acordo com o que tateamos, com as queimaduras que adquirimos, com as alegrias que passamos, sobretudo, com as perguntas que fazemos. Enfim, essa coisa toda de crescer pra ser mais sério é maior balela.

Um comentário:

Carol da Matta disse...

Não tenha dúvidas de que guardamos em nós todas as idades. Se eu não me olhasse no espelho, teria certeza de que ainda sou uma menina. Minha vó (uma mulher incrível) costuma dizer que a desvantagem de envelhecer é que cada vez mais nossa aparência trai nossa essência.
A propósito, feliz aniversário!
Continue fazendo as perguntas certas e encontrando felicidades diárias!
Beijos!