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Nem sempre sou quem escrevo, mas sempre sou quem escreve.

domingo, 26 de outubro de 2014

Sou

Aquela árvore rosa
japonesa
que eu não lembro o nome

sábado, 25 de outubro de 2014

Será

Tanta coisa trouxe a gente aqui
E cada uma veio de um lugar
É como se todos os ventos
Se juntassem onde a gente está

E ninguém pode dizer
Nem mesmo saber, pra onde apontar
Das minhas falhas não sou eu quem cuido
A mim cabe querer andar

No fim do dia, todo mundo mora
No olho do furacão
E acha que pode explicar
Escrever o que diz
Numa tábua qualquer

Aceitar que não dá, talvez
Seja a melhor opção
Vai doer não ser dono de si
Mas vai passar.

quando a luz bate atras de você
não ha detalhe, não.
uma massa escura.

foi quando o sol se pôs em você
e não me entenda mal,
eu queria o dia pra mim. 

e eu fico parecendo cristo,
porque dói
mas na verdade 
não há marcas nas minhas mãos.
e foi ele mesmo quem pediu 
pra eu não me martirizar
ou será que ele pediu?





terça-feira, 21 de outubro de 2014

A culpa é do Batman

- Caô.
- Juro. Tô te gastando não, cara.
- É sacanagem, não é possível.

Entenda, aqui, que as discussões de bar em algum microcosmo do Rio começam, em maioria, sempre assim. Terminam no trigésimo casco, com alguém voltando pra casa de busão e percebendo só no dia seguinte que roubou o copo americano.
Mas discutir e/ou revelar é o que move uma mesa que antes estava quieta.

- Aê, esse aqui é o Gil. Gil, Fábio, Fábio, Gil.
- Colé.
- E aí man.
- Mas diz aê Bin, viu o fluzão doutrinar ontem?

O amigo em comum chamava-se Bin. Não me pergunte porquê, mas alguém um dia chamou ele de Bin, e aí a coisa se institucionalizou. Ninguém sabia o nome dele até adicionar na internet: Ricardo Gomes (Bin).
Bin era o PMDB das amizades. Jogava pros dois lados, sempre, nunca polêmico, nunca muito agressivo - tinha medo de que o pessoal não gostasse dele. Sabia de tudo um pouco, mas nada muito.

- Vi, rapaz. Jogaram bem, né? E o Fred!
- Fred jogou mal pra cacete.
- É.

Quem sabe vai entender que, lá pra sexta garrafa, dá vontade de mijar. E aí já era, geral levanta, mija, volta, come uma isca de peixe, molha no rosê, dá um gole, levanta, mija de novo... Gil, até agora quieto, meio excluído, foi no banheiro. O banheiro era espelhado dos dois lados da cabine do mictório, estreito o suficiente pra ele ver pelo menos umas dez cópias dele mijando ao mesmo tempo. Deu aquela angulada no corpo, apoiou uma mão na parede...

- Esse teu amigo aí hein cara? Não fala nada.
- Ele é gente fina, man. Só é meio tímido.
- Que merda hein. - Deu uma risada alta e um tapa nas costas de Bin, puxou sua cabeça contra o peito dele.
- Acontece. - Bin não tava muito feliz ali, tava rolando uma pizza debaixo do ombro de Fábio, perto do cavalo da blusa dele.

Gil chegou, sentou. Era meio tímido mesmo, tava difícil falar alguma coisa. Parecia que fábio ocupava as quatro cadeiras da mesinha. Pediu gurjão de peixe. Até aí tudo bem. Estranhou Bin comendo aquilo ali meio forçado. Olhou a menina que passou, acendeu um cigarro. Era a vez de Bin ir no banheiro. Na cabine apertada, Bin tava tão distraído que nem percebeu suas cópias. Lá fora começou a passar um MMA na tevê, era a luta do Mick The Brick contra o brasileiro Júlio Pedra. A porrada cantou.

- Boa, Júlio. - Disse Gil quando o lutador acertou uma na cara do Brick.
- Sou fã desse cara!! Luta demais. Muito rápido.
- Estudei com ele no 2o ano. A gente se fala até hoje no Whatsapp.
- Caô.

Assim a coisa desenvolveu pra Gil e Fábio, num momento pequeno em que Bin tava lá aliviando, e depois parou pra conversar com um amigo que tava passando na rua. Não conseguia ignorar, e o cara falava pra cacete. A conversa dos que estavam sentados foi indo, passou pelas meninas que passavam no bairro pra quem vota em quem, e depois fluiu pra histórias de época de escola, essas lendas de botar ki-suco na caixa d'água e todo mundo beber suco de uva durante uma semana... Chegou no filme do Batman que tava no cinema. Que filme merda. O Batman tinha mamilos na armadura.

- Nossa man, ridículo demais! Aquela parte da luta. Dá pra ver claramente que é falso. - Fábio gostava de filme de ação.
- E o roteiro! Ridículo cara. - Nesse momento Bin veio chegando.
- Aí Bin, e aquele filme escroto do Batman de mamilos?

Taí uma coisa que Fábio não sabia, mas Gil sim: Bin era fã do Batman. Mas muito fã mesmo. Seu lençol era do Batman. Seu protetor de tela do celular, sua capa do facebook, até o caderno da faculdade era do Batman. Esse fanatismo era porque seu pai, falecido há muito tempo de câncer, se vestia de Batman todo Natal pra entregar os presentes. Essa tradição era tão lógica quanto o apelido de Bin.

- Vai a merda, Fábio.
- UOOOOU
- Que isso, cara?
- Ele é fã do Batman, man! Cê não tava ligado não?
- Caô.
- Sério.
- Hahahaha que escroto Bin, tu é fã do que no Batman? Do peitinho dele?
- Tu ta me gastando assim, mas fica passando noite acordado jogando Lol, coisa de virjão! De merda.

Aí. Ferida exposta dos dois lados. De um lado, um RPG online cuja comunidade ia de gente esquisita até gente esquisita. Do outro, uma comemoração natalina bastante peculiar. Bin xingou os dois e saiu bolado. Fábio ficou meio sem graça, afinal, não era nem um CS, era Lol.

No trigésimo casco, Fábio pagou uma parte generosa da conta, e foi embora de taxi. Naquela noite não teve aventura virtual. Gil pegou um ônibus mesmo. Ligou pra uma menina que ele tava afim. Bin chegou em casa andando, morava perto. Acordou no outro dia com uma certa dor de cabeça, percebeu o copo na sua pia. Ele tinha um amigo a menos. Culpa do Batman.



domingo, 19 de outubro de 2014

Tremeluzir

As mágoas do saber são rubras.
Bom tempo pra estar na beira de um lago
E se ver.

Dura é a imagem espelhada.
É esquecer a lágrima,
Jogá-la ali
Pra deixar de ser
Virar lago,
Tremer quem sou
(Ou quem penso ser)

Manchar aos poucos a água
Com a minha própria consciência.
Gotas de sangue num plasma,
Luz que incide por trás,
Revela a noite em si:
As mágoas do saber são rubras.