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Nem sempre sou quem escrevo, mas sempre sou quem escreve.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

5760 (Parte I)

- Grande bandidagem é ser hipócrita. Todos nós somos, incluindo você.
- Ah meu jovem, fale por si. Bandido? Eu? Nunca!
- Ao menos eu assumo os meus delitos. Nunca cometeu nada de errado? Tens cara de transgressor, velho maldito!
- Pois já os cometi na minha fase ignorante. Agora não mais os cometo! Você é um jovenzinho ousado, crê que sabe de tudo e entende todos! Mas não passa de um idiotinha qualquer.
Era o que ele era. Um idiotinha qualquer. Talvez apenas nos conceitos desse idoso com a mente cauterizada pela própria hipocrisia. Ele se deixara possuir, vendeu-se por um preço fácil. E a hipocrisia dele deixou de ser uma qualidade básica e passou a dominá-lo de forma integral, cegando-lhe os olhos. Ele se achava perfeito. Nada tinha a esconder, exceto o que esse demônio que o dominava acobertava cheio de medo. E o jovem ainda batia o seu pé e matinha a postura: Todos eram hipócritas. E transgressor mor era aquele que tentava escondê-la, era o moralista, o legalista... todos esses. Não havia um homem sequer que não necessitasse de correção. E ele estava prestes a cuspir tudo isso na cara do homem velho, dito mais experiente, que o chamava com toda a sua sapiência de idiota.
- Há, mais você é hipócrita mesmo! Devia ter te acusado antes, mesmo sem provas. Tenho nojo de você, velho sujo. Lógico que comete erros, e tenta escondê-los com a sua hipocrisia, e depois esconde a sua hipocrisia debaixo de uma camada mais espessa de mentiras!
- Cale a boca, Mikhail! Você é o verdadeiro hipócrita. Estás ai, olhando-me de cima, acusando-me como se não tivesse nem um pingo de mentiras em sua boca! Você diz que eu sou maldito, mas não consegue esquecer a desgraça do passado e a esconde da mesma forma! Atrás de uma falácia! Como se não houvesse homem justo no mundo! Como se tudo que todos falassem fosse mentira! Você só não suporta a morte de seu pai!
Mikhail era um jovem de inteligência notável. Nascera em 1930, no décimo sétimo dia de janeiro. Conseguiram se manter anônimos durante algum tempo, mas foram descobertos e mandados para Auschwitz. Sua mãe e ele sobreviveram, mas seu pai não. Morreu com um tiro de um soldado alemão em 44, numa execução digna dos filmes. Mikhail e sua mãe foram libertos no dia do seu aniversário. No peito, a dúvida entre qual sentimento sentir: A alegria por sobreviver, ou a tristeza por se lembrar da perfeita fisionomia do alemão que matou seu pai. Escaparam então, em meio à confusão e pânico, e vieram parar em Niterói, no Rio de Janeiro. Sua mãe se casou em 1946 com Victor, o velho, um profissional liberal meio rico, meio pobre. Mikhail não se agradava dele. Era ele, ele cismava que tinha sido Victor, ou qual nome o pertencesse, que tinha atirado em seu pai. Sua mãe não estava lá para ver, mas ele estava. Ele viu. Ele chorou. E pra compensar, Victor apresentava uma história de passado que tinha cara de inventada, descontínua, Mikhail estava paranóico demais. Era de se entender. Carregava com ele a lembrança traumática de ser o número 5760. Estava escrito na pele. Aos 25 anos, ja havia arranjado trabalho num jornal pequeno. Tinha tino pra repórter e aprendia fácil. Trabalhava de meio expediente, das 6 ao meio dia, e usava o resto do dia para duvidar e desconfiar de Victor, sempre negando o passado que lhe era acusado de ter vivido.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Inspiração

Deixei minha inspiração
no último ônibus que peguei.
Se alguém
por acaso
vir um ônibus colorido e voador, me avise,
Quero de volta o meu gosto.
Quero de volta o meu rosto.

A Felicidade (6 billion others)

Gostaria de começar falando desse projeto sensacional que me emocionou até demais, num momento que me emocionar se tornou difícil. Começo isso aqui de forma bem pessoal e informal, por que acredito que é esse tom que o assunto pede. O Projeto 6 billion others, criado pelo francês Yann Arthus-Bertrand, é de uma sensibilidade inenarrável, buscando o indivíduo e as suas emoções particulares, quando ao mesmo tempo, mergulha nas águas incertas da filosofia e da sociologia visitando diversas visões de mundo. O projeto se hospeda em: http://www.6milliardsdautres.org/, e você também pode compartilhar a sua experiência pessoal, tal qual seus conceitos e filosofias. É um projeto de pessoas, não de massas, e é isso que atraiu o meu olho. Aproxima-se do ser sem dispensar as condições que eles estão inseridos. Apresenta cubanos, suecos, nigerianos, chineses, indianos, estadunidenses, franceses e muitos outros. Pude ver a parte na qual as pessoas discorrem a respeito do conceito de felicidade. Segue o vídeo, e não me atrevo a dizer o que é a felicidade pra mim.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

;~

Cansado e sem tempo, dei-me aos pequenos poemas com sentidos óbvios. Amo fazê-los. Isso está se tornando cada vez mais divertido e menos pesaroso. Não que eu odeie os grandes e sofridos que fiz, amo-os da mesma forma. Mas é que por esses tempos estou sem tempos para sofrer, e pensar, e amar, e viver o suficiente para escrever e tudo o mais. Atualizarei mais dentro de tempo.

O tropeço

Trôpego tropeço
Tratos como trapo
Maus tratos
Com o trôpego transeunte
(ah, se ele tivesse extratos!)
Que há travessava
A travessa transparente
Com traços de pranto
Beba dor.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Se eu pudesse fazer
da sinestesia algo real,
Expressaria nesse poeminha
De uma nota,
Uma nota só.
Pra poder entender
O dó.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Sem você sou pá furada!

O velho e a peste.

É, fui arrastado. Minhas unhas arranharam o chão. Não queria sair de Niterói. Ainda mais agora... vir pra Cabo Frio? Tenho 85 anos(mesmo que mentais) e só saio de Niterói por vontade se for por um velho amigo, ou pra ir até a Tijuca. Ah, sim, a Tijuca! Tanto ufanismo e eu não sei nem por que. Mas lá eu encontro meu lugar. Quero morrer onde nasci. Mas cá estou, Cabo Frio. Arrastado e tedioso. Não há velhos amigos aqui. Estou passando o tédio de ficar trancado em um apartamento na cidade que dorme tarde. Abriga os jovenzinhos com suas roupas multicoloridas e demasiadamente estampadas, quando alguns pseudo-literatos carregam seus crepúsculos e luas novas por onde vão. Esses jovens, nunca vi! Reclamando de mim, dizem que não tenho gosto de viver... É por que a vida deles ainda é doce. A minha já foi, na Tijuca. Mas encontrei um refúgio num pequeno centro comercial perto da minha cela, e aproveitando do meu regime aberto me encontrei numa loja de livros. Maravilha, agora sim, algo de bom. Comprei-me um livro novo, estava desprovido deles. Mal eu sabia onde o determinismo ia me levar. Levei Albert Camus, no romance "A Peste". "Aí sim", pensei, erradamente. Me desloquei até uma pequena praia, pela calma diria eu um canal, que por brincadeira de ótimo gosto do horizonte, fundia seus montes e mais parecia uma lagoa de pequenas ondas que aumentavam de força e frequência a medida que passava uma lancha ou escuna. A faixa de terra era longa, porém estreita. E eu encontrei paz e ventos bons encostando-me no que fora um dia uma rede de voleibol. Paz, por pouco tempo. Maldita superficialidade! Entraram em cena um marido mandado e uma loira semi-obesa, que tentava tirar fotos de nível profissional. Dava ordens incessantes ao marido calado. Só isso pra tirar minha paz. Li sem entender nada o primeiro capítulo do meu livro. Resolvi me levantar pra ir, e a gorda resolveu que também queria ir na mesma hora que eu por sarcasmo do destino. Me irritei e procurei a primeira futilidade que me veio à vista. Pronto. Estou nessas casas de computador (como é que esses jovens chamam hoje em dia?) escrevendo.