Minha foto
Nem sempre sou quem escrevo, mas sempre sou quem escreve.

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Explicações incoerentes sobre a incoerência diária



"Tô te explicando pra te confundir
tô te confundindo pra te esclarecer
tô iluminando pra poder cegar
tô ficando cego pra poder guiar."

(Tom Zé)

Pois bem. Há muito venho falando aqui, e sem maior explicações, sobre o nada da incoerência diária. Resolvi deixar claro - e isso é incoerente demais, peço perdão à toda a arte que já redigi até agora que fala sobre a incoerência - e dar coerência a minha incoerência, que continuará a ser incoerente, pois não há razão para uma incoerência ser de todo explicável.

Todo ser humano é incoerência. Um impulso. Texto que é excretado sem revisão posterior, sem perceber pontuação, e aí temos a prova viva de que nossa natureza não sabe ligar as coisas direitos. Precisamos repensar tudo o que é posto no papel, tudo o que falamos, repensar até os ideais para que possamos alcançar a tão desejável coerência. Vivemos em constante reformulação pessoal de nós mesmos ajustando nossas descontinuidades e dando lugar a novas.

Porque é tão ruim ser incoerente? Por que sim. Porquê nos cobram isso toda hora, saber usar corretamente os nossos por quês. Talvez aceitar? Sim, eu resolvi fazê-lo, e convido quem mais quiser artificar a incoerência que mora dentro de si a escrevê-la, pintá-la, construi-la, canta-la, varre-la. Escrever dentro do padrão que não há padrão. A regra é: Não há regras. E a regra já transforma a arte em arte - pois, se há a regra de que não há regras esta regra já está transgredida.

Como exteriorizamos a incoerência? Exteriorizamos a nicoerência através de impulsos. Os erros, as descontinuidades. Parece metalinguagem, mas não é. Ou é e não quer ser. Deixamos claro que a incoerência mora no ser quando ferimos por amor, quando amamos o ódio, quando vendemos ideais, quando dizemos sem pensar. O impulso precede a descontinuança de tudo. O mundo.

Espero assim, ter confundido a todos e também ter me privado de reclamações indesejadas. Espero que esteja tudo bem explicado.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

O Porque dos Natais

Há os que digam que se deve desejar esses tipos de coisas no natal - felicidades, paz, saúde. Viram todos grandes mahatma ghandis, distribuem presentes, cestas básicas, meninos jesuses fabricados numa linha de produção Henrifordista. AS ESTÁTUAS! Sim, presépios, presepeiros, adoram gritar o amor e a felicidade anunciada nos dias em que um gordo de gorro sai por aí num trenó voador. Sinos pequeninos de belém batem em todo o mundo, na tv aberta, os mesmos filmes, na fechada, os novos que parecem velhos. Pensa-se na vida, na traição que cometemos à esposa, nos amigos que jogamos no lixo por levá-los em conta, nas pessoas que ferimos sem querer querendo. Há um pingo de esperança, o "querer mudar" que todos nós almejamos. Findo o natal, voltamos às nossas práticas não natalinas. Desarmam-se os presépios, tanto AS ESTÁTUAS! quanto os presépios que armamos em nossos pescoços, retiram-se as guirlandas, desmonta-se uma árvore (?). Voltamos, sim voltamos. Os meninos jesuses são jogados no lixo, recém nascidos em nossos corações. Os mahatma ghandis são assassinados em nossos peitos. Eu descobri o porque do natal. Descobri porque damos luz à menino Cristo e depois o crucificamos rapidamente, após 33 anos que se passam numa virada de dia - é tudo uma jogada, Henry Ford precisa produzir ano que vem.


Desejo aos meus leitores que nossos meninos jesuses permaneçam em nossos corações. Que exerçamos o natal todos os dias.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Felicidade e gás

Liga o fogo
do fogão
na melhor boca que tiver,
e deixa a vida, amor,
roubar os sorrisos que devemos a ela.

Amar não é prender,
pelo contrário - se libertar.
É assim que a gente vê
felicidade e gás.

sábado, 18 de dezembro de 2010

Ao calor de um sonho

O desespero é o desaquecer da idéia.

Um pensamento que aflige
é um que já passou.
Não há como (e como seria bom se assim não fosse):
estar aflito é condição ao depois.

Se há forma de responder
um pensamento em simultâneo, dessa forma eu não sei.
Pensamento não têm forma, não tem forma.
É a desconstrução do amar a primeira vista:
Não existe! Não existe.

Quando assim uma idéia nos passa
feito vento que balança a existência pesada dos galhos de uma oliveira,
aflige o medo de entortar
só depois que já passou o sopro;
só depois que já pensou-se o mundo;
só depois que já doeu-se o amor;
Quando findou o poema...

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Comodidade

Foi tão cômodo que se pudesse viver, e se meu peito, com as suas funções orgânicas engolisse aquela faca e a alojasse em meu interior, seria provável a felicidade. Ma retiraram no hospital. A felicidade é - por que não seria? - cômoda que só. Disso eu sei. A faca foi feliz em meu peito, talvez. A esta altura do texto, o leitor já deve estar se perguntando de onde escrevo isso, e como a tal faca fez para adentrar em mim. Pois bem: Escrevo do túmulo, talvez gostaria que este fosse meu epitáfio. Talvez não, seja feliz demais. Ah, mas que se dane. Eu me matei mesmo, viu? Viram? Chora não. Me matei porque eu tava era feliz demais. A felicidade é cômoda que só. Se acomodou e virou tristeza. A tristeza, essa sim, essa é batalhadora, alienadora, faz a gente deixar um monte de coisa pra trás que engoda nossa felicidade. Daí ela vem, a felicidade. Como é mal-acostumada. Preferi me matar no dia em que eu recebi essa promoção no emprego, virei gerente geral, poderia inclusive pagar minhas contas, comprar um carro novo, quiçá mudar o apartamento apertado em que morava. Quão feliz foi esse dia. Daí veio a idéia de me matar antes que essa felicidade se acomodasse. Pois bem, foi o melhor final de vida que eu já vi. Foi bom demais. Doeu quase nada. Apontei a faca pro peito e me joguei no chão. Aí acordei por aqui. Tô feliz, sim, pra caramba, não se preocupe, nada me chateia por aqui. Acho até que eu vou me acomodar.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Tempo Vago

Bem, confesso que eu não sei
ao certo o que farei
sem ter você aqui.

Posso ser um campeão de bocha;
Posso ser fluente em finlandês;
Posso aprender que pedra é rocha,
deixar tudo claro de uma vez.

Posso perceber que o sol é puro,
e que os outros só tem dó de mim;
Posso descobrir que lá no escuro
é menor e é melhor assim.

A saudade eu não ousei guardar no bolso:
Joguei no mar.

Posso aprender corte e costura;
Posso me jogar de um trampolim;
Posso ler livros de capa dura;
Tatuar na pele um guaxinim.

Posso perceber felicidade
nessas coisas que ninguém mais vê.
Perder a noção da minha idade
Perder um programa de tevê.

É tanto tempo vago
e tanta opção!
Deixo a arte me guiar.

domingo, 12 de dezembro de 2010

#4

foi
a percepção da vida
cortou-se
a última linha
o fio de cabelo
a teia de aranha
que me prendia
aqui
no mundo

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Explicações dum desiludido

A verdade é que não há verdade. Não há e ponto. E não venha você me criticar, pois a mania de desconstruir as coisas é minha, e eu faço, desconstruo o que quiser com ela. Você nunca parou para pensar em nada? Na verdade, nada existe de verdade. Juro. Se você for parar para olhar o âmago de algo, a sua real essência, descobrirá que essa tal coisa não existe. Como por exemplo a verdade. Não existe. O amor, também não existe. O mundo, o universo, a realidade? Também não. Nada é real. O presente, não existe. Tanto o produto do amor quanto o produto do passado. O passado é um presente que não existe mais, mas, se o presente não existe só o que nos resta é o futuro, que fazemos no agora, que também não existe, não existe, não existe. Você está parada no nada. No nada. Muito nada é tudo. Muito tudo é nada. Tudo é nada e vice versa, meu bem. Nosso amor nunca existiu, tá provado?

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Capitaneando

Ah, meu bem
eu mais que ninguém sei
que o vento quando sopra forte
entorta a palmeira
esvazia a beira do mar...
no entanto convém:
Bate na vela
estufa, revela
horizontes na maior rapidez.
Deixa lá
Venho ver o mundo
Capitaneando a frota de um coração só
Navio
Longe vá, sem se ver
sem ser vil.

A vida e a obra de margarida

Nasceu
Entre uns talvez
uns pode ser
e os blocos de cimento
- paralele, paralale, parararle -
enfim, nasceu!
Que bela é
com sete pétalas branquinhas
e o botão amarelinho
cheia de arte! Cheia de vida.
Margarida
a margarida
amarga.
Marga estava só
sofrida
Margarida
Amargurada, querendo ser querida.
Pois bem, ali passava um cego,
e não a viu
depois um homem de negócios
(que não deixa de ser um cego)
não a viu
passou a socialaite, a patricinha, o bon-vivân
não a viram
Passou um pneu sobre a pobre da margarida
na rua, despingolada, desguarnecida
amarrotada, destituída,
amargamente atropelada
morreu a margarida.
Se um pobre tivesse passado
talvez não visse a margarida.
Margarida só era vistosa
aos olhos d'algum pobre e artista.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Bangue-bangue

Sim, óbvio que negarei joão que aceitará luiza que o negará depois de perceber que ama pedro, mas esse não corresponde pois me ama e eu o aceito assim, o mato depois de amá-lo profundamente com todas as minhas forças de alguns meses ou semanas. Tenho certeza, mas não sei bem se é o que quereria minha mãe, afinal quão incoerentes são as pessoas, se ela quisesse que eu a obedecesse não me daria regras e o meu bom senso seria o meu guia e ela não precisaria de me bater tanto por tanta merda que fiz. Não há transgressão quando não há regra. E a regra de não haver regras já é transgressão, portanto, não podemos fugir da corrupção que nos foi imputada. Mamãe me deu regras, deu regras a pedro, a joão, a luiza, deu regras ao mundo, deu caixas, sapatos, roupinhas aos pobres e morte aos favelados, deu-me as cores as formas os nomes as dores os sentimentos as convenções. Lembro-me bem de pedro lá em casa antes de nos matarmos e a gente assistindo uns filmes de matar bandido e mamãe disse que bandido tinha tudo mesmo é que morrer, transgressores das regras morais, porque a gente tinha direito de viver bem, todo mundo tinha. Todo mundo tinha direito a viver, e amar, amar joão que amará luiza que amará pedro que amará a mim que amará a pedro e a joão, talvez ame até luiza se puder. Amar é bandidagem.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Ser

Sou
(...)
formado de muita gente
misturado com um pouco de eu
que é
formado de muita gente
misturado com um pouco de eu
que é
formado de muita gente
misturado com um pouco de eu
que é
formado de muita gente
(...)

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Sentidos

(Grito)
Deixeu me libertar!
Dos sentidos,
Dos pelotões da significação!
Não dá pra ser assim sempre, essa prisão!
É tudo que tenho sentido...
Pois bem, me rendi,
E todos apontaram as mãos,
As canetas em minha direção
"Esse está louco,
Precisa de internação!"
Essa loucura dos sentidos:
A convergência sanidade,
a conveniência da arte,
Lapidando diamantes
Como se o bruto
não fosse o natural.

domingo, 14 de novembro de 2010

Cláudio

Sabe Cláudio, estive pensando muito nesses dias sobre o significado da vida. Talvez ela seja eterna quem sabe? Sei, isso sei bem, que me bateu uma gastura imensa por talvez não existir também. Você me entende, Cláudio? De que valeria eu entrar no novo emprego, gostar do Felipe, amá-lo, casar com ele, transar com ele, ter filhos, nomeá-los após dois dias de luta ferrenha para escolher o nome: Martim. Martim decerto é um bom nome, e será um bom filho, me mandará para um bom asilo, o Retiro dos Artistas talvez, quem sabe, Cláudio? De que me vale depois disso tudo, morrer? Ao menos quero ver o casamento de Martim com uma menina chamada Isabelle, com dois éles, é mais chique. Mas e se eu morrer antes Cláudio? Se eu morrer sem ver Martim se casar, ou ver minha neta, Vitória, crescendo e rolando sua pequenina bola multicolorida pelo jardim onde plantarei meus gerânios, meus ipês amarelos, minhas tulipas e violetas? Rosas não Cláudio, rosas são horríveis, ainda mais com todos aqueles espinhos, que podem machucar Vitória! Ah Cláudio, deveria também assistir Vitória crescendo, e tendo filhos, e Martim se divorciando - porque hoje em dia casamento não é como o nosso, Cláudio - e Isabelle - com dois éles, lembra? - chorando em meus braços porque ele é um insensível, ele se entregou à cachaça, e agora, como Vitória irá crescer?, e ele está vendo aquela vagabunda da Gisele, não, não pode ser!, chora, chora, chora... faz bem pros olhos, é feito cenoura, toma, toma esse copo d'água com açúcar porque a vida não é romance, minha filha, e é pra isso que existem os filmes. E Martim feliz da vida, ou da cachaça, sempre quando me vê. Enche-me de alegria quando pisa na minha grama e olha, levantando as loiras sombrancelhas, para a minha face enrugada e deteriorada e dá um sorriso de como quem agora é tão experiente - e tão chagado pela experiência - quanto eu. Vitória certamente não se casará, mas terá um filho. Ela até que cresceu bem, pra quem tem pai envolto na cana, e que já fez outra filha com a Gisela, Gisele, sei lá, o Sebastião. Sebastião verá Santa Cecília do Norte e terá de seguir celibato, rezando as missas de minha igreja, com lindos sermões por sinal, enquanto o filho de Vitória, Pedro, deverá crescer em uma nova estrutura familiar - só me assusta, não pode virar afeminado. É Cláudio, me deu uma gastura esses dias. Gastura de quem tem que viver pra sempre.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Sobre a incoerência diária

Há dias em que me sinto incoerente,
E dias em que não.
Talvez nesses, mais do que naqueles,
Exerça com fiel fervor o paradoxo.

Como na luta apostólica,
O que a mente quer o corpo nega:
O que quero fazer, não faço.
É como correr contra si mesmo
E chegar em segundo.

É como o amor que não se merece
(é como todo o amor, se for assim),
Como o sentimento, paixão, vigor
Desperdiçado no que não convém.

Se assim,
Me permito a mim a incoerência,
Pois condiz ao ser humano
Ser incoerente.
Não é?

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Sobre as surpresas da vida

Um dia me perguntaram quem sou
Eu respondi quem não era
E a vida me surpreendeu
Sincera.

domingo, 17 de outubro de 2010

A paixão e Os meninos da rua Paulo

Nemecsek estava definitivamente doente. Mas deu sua vida pelo clube. Há de se arriscar a vida por algo, talvez por algo que se ama. Não, não, certamente por algo que se ama. O amor transcende a justiça. O amor se faz algo a mais, dando a quem se ama mais do que merece. A vida vale bastante. Pois bem, da mesma forma ele, Flávio, arriscaria sua vida por algo. Nemecsek merecia seu respeito. E por coincidência, sua doença iria matá-lo em pouco tempo. Se ele quisesse dar a vida por algo, teria de ser rápido. "Rápido, mas bem feito" pensava. Por que não arriscar a vida por um amor comum? Faltava água no filtro. Havia alguma em uma panela. Bebeu. "Que gosto horrível, gosto de metal, gosto de remédio, mas é só isso que tem mesmo, então bebe logo esta merda flávio, que você vai apontar sua vida pro canto certo hoje e vai morrer feliz".

Flávio subiu ao ônibus. Avistou a mais bela das meninas sentada no banco alto, do lado do corredor. Sentou no lado oposto. Olhou, virou, olhou, fez cara de dúvida, pensou, pensou. "Qual nome vou usar? Anda flávio, pensa logo nessa droga, se não a menina puxa a cordinha e você vai morrer feito teu tio, de repente e infeliz, naquele acidente de carro, morra de forma premeditada. Cacete flávio, pense, Carolina, Carla, Mariana! Isso. Ela definitivamente conhece alguma Mariana. Não tem erro flávio, vai que é tua." Olhou pro lado. "Vai Nemecsek! Vai, morra pelo sonho."
- Você que é amiga da Mariana?
Coincidentemente era amiga de Mariana, sim, muito amiga, confidente.
- Mariana Corrêa?
- Isso, essa mesma! Acho que eu te vi na festa dela!
Foi um salto no escuro.
- Acho que me lembro de você. Estava bêbado, não é?
- Talvez... não me lembro!
Ela morreu de rir. Flávio morria.
- Sente aqui - disse Flávio - assim a gente pode conversar melhor.
- Claro, por que não? Gostei de você.
"Isso flávio, você é o novo nome do mundo. Travou uma batalha importante, como Nemecsek. Pena que está morrendo, essa menina faria a ti um grande bem."
- Meu nome é Natália.
- O meu é Flávio. Eu também gostei de você. Acho que deveríamos nos encontrar, mesmo com a Mariana, qualquer dia desses.
- Acho que a Mari não precisa de ir.
E eles marcaram de ir ao cinema no dia 15. Dia 14 Flávio morreu. Tranquilo, feliz. Arriscara sua vida por algo que valia a pena.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

O melhor lugar do mundo

O melhor lugar do mundo
Não é no mundo.
O melhor lugar do mundo
Está em nós.
Reino dos Céus.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Considerações sobre a felicidade humana.

1
Esses dias descobri
Onde está a felicidade.
E como se não fosse tão óbvio quanto é,
Revelo, para o espanto geral
(e a atitude blasé dos mais informados):
A felicidade está na ponta do nariz.
E como a gente procura a danada!

2
A felicidade se coloca ali,
Penso eu, para vários motivos:
Para a esfregarmos na cara dos outros;
Para que todos a possam ver
Para que todos a possam desejar, por não ter
Para que nunca possamos alcançar.

3
A felicidade está em um beijo.
Porém, nunca se sente a própria felicidade.
É sempre a felicidade do outro,
Que se esfrega em sua face,
Dessa vez com carinho e paixão.
A felicidade está na ponta do nariz,
Na ponta,
Ponto!
Beijo

4
E se perguntarmos uns aos outros
"Por acaso não posso me ver ao espelho?"
E a resposta então se esconde,
Como a felicidade,
Mas é clara como o reflexo.
"Quando nos vemos no espelho,
A tristeza nos acomete,
Vemos o que há de feio,
Real, físico,
E talvez a felicidade não pertença a essa classe de sentidos"

5
Se a felicidade está na ponta do nariz,
Que eu fique então
Muito,
Mas muito gripado.

6
Talvez seja por isso que nos intrigam os focinhos caninos.
Ali há um monte de felicidade.
Uma felicidade encharcada,
Assim como no focinho de outros animais.
"Animal não pensa!"
Mas, quem disse que pra ser feliz é preciso pensar?

7
Talvez seja o contrário de tudo.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

#3

Numa odisséia pancrática
Onde as armas me desarmaram
Lanço mão de elemento apoético:
Banana

Do décimo sétimo andar (Continuação da continuação; Parte IV)

E quando os dias iam passar, resolvi me livrar da caixa de sapato que continha as fotos. Eram milhões de fotos. Joguei-as do alto do prédio. Era como um suicídio, mas junto puxava Ela e alguns amigos que agora me falham à memória. Talvez eu tenha chorado, talvez tenha assassinado algumas lágrimas que se perderam no meio do caminho, do 17° ao chão. No final, preservei apenas a caixa, onde pus um sapato social que não usava há tempos. Agora a caixa exercia a sua devida função, poderia voltar a acumular poeira no alto do armário.

Dormi.

Na verdade, na verdade, eu não me lembro muito bem no que sonhei. Mas creio que o raciocínio induzido é capaz de preencher as lacunas que os sonhos deixam. É como um divertido jogo de cruzadas. Mas preenchendo foi que percebi que se formava uma imagem perfeitamente igual à imagem do sonho. Era esguia e tinha olhos atentos. Um pouco arregalados, talvez, mas nem tanto. Eram tão delicados quanto os soslaios frequentes que lançava. Definitivamente eram olhos belos, curiosos, soslaiantes. Não, não eram aqueles olhos que mal se percebe onde começam, onde terminam, não, via-se com nitidez a parte branca inundando o castanho escuro da íris. Seu nariz era meticulosamente empinado, fino e gracioso. Sua boca era delicada como a sua voz, leve, tranquila, desprovida de qualquer autoridade. Os cabelos eram estranhamente um misto escuro de liso com pontas onduladas, o que combinava com o castanho de seus olhos. O corpo era representação da face. Bonito e comedido. Eu a idealizava assim. Talvez ela nem fosse assim, ou fosse, nos meus sonhos. Romantismo idiota, sempre acordando as pessoas felizes. Se existia alguém no mundo que não queria se apaixonar, esse alguém era eu. E ponto. Estava feito: Uma mulher de um sonho, que nunca havia visto. Pelo menos ela não me decepcionaria.

Foi no passar desse dia, ao acordar, que percebi que não comera nada nos últimos três dias. Senti uma fome indiferente, não me apertava a fome. As prateleiras noticiavam que não tinha feito compras do mês, muito menos pago as contas de luz e telefone, se é que tinha telefone nesses dias, se não já o tinha varado pela janela. Achei um pacote de alguma coisa. Comi. Eu definitivamente não queria pagar minhas contas. Não queria pagar às companhias e nem queria pagas as contas que tenho com todos os homens. Senti-me no fundo de um poço. Olhei pela janela. Senti-me no alto do mundo. Talvez quando pensamos que estamos construindo a nós mesmos, quando estamos a nos edificar, é aí que encontramos o fundo do poço, e quando nos percebemos na miséria, é quando nos construímos mais rapidamente. Estava agora acima de todos os homens. No 17°, era acima de todos eles, insignificantes. Como se eu fosse rei do mundo, mas ninguém soubesse disso, como a fantasia do pequeno jovem, que namora sua amiga sem que ela saiba.

Eu definitivamente era o rei.

Mandava neles! Sim! Mandava em todos! Mandava sinais abrirem, mandava carros pararem! Mandava passaros voarem e nuvens se moverem! - Homens, respirem agora! Isto é uma ordem! A submissão é algo lindo quando visto de cima para baixo. E nem déspota eu era. Absoluto sim, mas amoroso. Nesse momento um sinal abriu sem que mandasse. Houve a colisão. - Merda! Eu mandei ir? Eu mandei abrir esta merda de semáforo? Não mandei! Bem feito! Ele morreu. Eu acho que deveria ter morrido mesmo. Desci do trono e deixei tudo correr nos conformes. Mandei a luz ligar. Ela não ligou. Tevê, ligue! Não ligou. Fogão, esquente! Nada. Mas não me irritei, acho que tem de ser assim, é uma escolha a se fazer: Se mando no mundo, não posso mandar também na minha própria casa.

domingo, 3 de outubro de 2010

Política

Como estudante do Ensino Médio, me arrisco na política. Posso estar errado, posso falar merda, mas acredito num ideal e numa concretização do mesmo para a melhoria do meu país. Realmente, acho hipócrita a Cidadania declarada, a cidadania imposta. Creio realmente que uma sociedade movida pelo sentimento nacional e a cidadania não seria panfletária do jeito que é. A cidadania parte do ato de pensar e agir de acordo com a melhoria do seu meio.

Acredito sim nos ideais de desenvolvimento, acredito em uma melhoria econômica através de uma moderação privada, acredito que o desenvolvimento econômico aliado a um pensamento de cidadania e integridade trará melhorias não só para o país, mas para toda a sua população, no que diz respeito à qualidade de vida. Defendo esses ideais com unhas e dentes, e parto do pressuposto que também é cidadania respeitar os pensamentos divergentes, sejam eles utópicos ou não.

Alguns me criticaram por ter anulado o meu voto para Deputado Estadual. Que eles fiquem a vontade. Anulei pois acredito que representei uma parcela da população descontente com alguns políticos de direita que andam por aí arrancando dinheiro dos cofres públicos. Não consegui achar ninguém que correspondesse à meu conceito de integridade e ideologia. Não que esse não exista. Iria votar num deputado de esquerda, Marcelo Freixo, mas achei importante representar, mesmo que ninguém entenda ou perceba, a minha decepção em procurar um deputado e não encontrá-lo. É como fazer arte para si. Respeito o Freixo, respeito o trabalho dele, acho ótimo, mas entendo que é importante representar meu ideal, mesmo que ele possa ser errado, mesmo que ele possa ser uma visão limitada de mundo, de alguém que se esforça por pensar, mesmo que ainda novo, num país de apolíticos e ignorantes anti-democráticos.

Cristiane

Há quem diga que a verdade é como vemos as coisas. Talvez realmente seja como soa. Seríamos então capazes de mostrar um hematoma feito por uma visão? Pois eu digo que sim: afinal, após um milhão de anos convencionando, sentimos dores no peito quando estamos tristes. O coração sente algo? Claro que não, a mente guarda todos os nossos sentimentos, tudo o que há de invisível no nosso corpo, as energias. Cristiane talvez não entendesse de metafísica, muito menos de corpo, mas sentia as dores no peito. Como todos nós. Era excelente em trabalhos domésticos. Realmente se esmerava e como se não parecesse verdade, adorava trabalhar dessa forma. Cantava músicas da jovem guarda enquanto lavava as louças ou varria a sala. Era nova na casa da jovem Mariana, que, de tempos em tempos, gostava de ouvir as canções da empregada enquanto trabalhava em seu computador, ou até parava as vezes para conversar sobre coisas rápidas e informais com a moça. Chegava as seis e meia da manhã, pontualmente. Mariana as vezes gostava de olhar o relógio as seis e vinte nove, e no exato momento em que viravam as seis e meia, ouvir o pedaço mais famoso da peça Für Elise de Ludwig Van em lá menor, anunciando a chegada de Cristiane. Saía as três e meia, também pontualmente. Era eficiente, em dois meses de trabalho nunca havia faltado, muito menos se atrasado - chegando ou saindo.

Em suas rápidas conversas com a moça, Mariana descobriu que tinha quatro filhos: Dois com um homem que nunca soube realmente onde viveu, qual seu nome, sua aparência, e outros dois com o homem que agora vivia em sua pequena casa, um rapaz de índole duvidável. Porém, não havia se divorciado, diziam os rumores que ela havia fugido do primeiro homem. Lá no fundo, isso realmente intrigava Mariana. Porque fugira? Por apanhar? Por brigar? Ou simplesmente pelo esmorecer de um amor que para humanos, deveria ser eterno? Não se sabe.

Então, quando naquela tarde ouviu-se o estalar do portão fechando, e Cristiane dobrou a esquina, Mariana pôs-se a pensar em tudo aquilo, na vida de Cristiane. Mais tarde, toca o telefone. Era o marido dela. Onde ela está meu deus ondeseraqueelafoiblablablablablabla. Mariana disse apenas que não sabia de nada. Ele repetiu a ligação duas vezes. E Mariana repetiu a resposta.

No outro dia, Mariana olhou o relógio: Seis e vinte nove. E ao badalar desimportante das seis e meia, não se ouviu Ludwig Van. Mariana esperou mais um pouco, mesmo que já soubesse do pior. Cristiane não chegaria, muito menos voltaria. Ela fugiu novamente. Fugiu para ter mais dois filhos, fugiu para trabalhar em outra casa, para intrigar outras marianas.

Mariana foi ao seu pai. Pai onde está Cristiane? Ele nunca tomou conhecimento da empregada. Sua mãe também nunca ouvira falar de Cristiane, muito menos seus irmãos, não sabiam das fugas, das chegadas e saídas, das canções da Jovem Guarda... Nem a campainha tocava Ludwig Van Beethoven! Mas Cristiane era tão vívida, tão intensa em suas cantorias e histórias! E agora? Cristiane havia trabalhado ali. Era verdade. Pelo menos, há quem diga que a verdade é como vemos as coisas.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

A caixa de sapatos (Continuidade do "Texto com fins de escândalo..." e "Meu aniversário de trinta e um anos")

Isso. E nesses dias eu abri aquela caixa de sapatos que eu guardava em cima do armário e não mexia há anos. Dezenas e Centenas e Milhares, Milhões de fotos dentro da caixinha. Bilhões de recordações. Todas elas ruins. Fotos me deixam realmente mal, de mal com os sorrisos. Todas me geram algum tipo de reflexão: Não reflexão no sentido convencional, mas sim no sentido literal. Eu me vejo nelas todas. Exceto por algumas que eu guardava dela. E me ver naquelas fotos, refletido, tal qual bobo da corte, palhaço de circo, rindo e fazendo as graças, não era agradável como pode ser para outros. Naquela caixa de sapatos eu me percebi doente. Doente ontem, doente hoje. Porém nunca havia parado para me perceber - tudo girava em torno da efêmera felicidade, do bem-estar que te corrói, te arruina com tijolos em punho. Olhas os tijolos, mira-os bem, junto ao cimento do chão e pensas: "Estou a construir-me", ou "Esse prédio há de crescer, hei de ser feliz assim". O bem-estar ataca-lhe os tijolos na cara e cospe no chão. O bem-estar volta para as fotos, retoma o lar em caixas de sapatos.

E é justamente quando abrimos a caixa de pandora que o monstro se liberta em forma de um sorriso no canto da boca. Seguido de uma conclusão desafortunada, uma percepção, um desatino, um desespero, e o choro incontrolável - precedido de uma forte pressão, como um embolado, na região da garganta, o marejar dos olhos e o impulso da alma para fora do peito -. E quando tudo parece que vai explodir, devido à pressão, ao impulso, o choro se faz, minuciosamente, curando o azulejo com doses homeopáticas de água e sal. O pranto desse reflexo é educado. É o pranto do espelhar-se, do perceber-se a si mesmo. Do ver-se nos olhos que o veêm, e o veêm, e o veêm...

Maldita caixa de sapatos! Por que fui guardá-la? Sejamos francos, eu sabia que esse momento iria acontecer, sabia que uma hora ou outra, eu iria entender que há um tumor maligno no meu peito, me corroendo, incurável! Há tempos já tentei me curar - que escândalo causei tentando dar cabo de minha vida. Devo tentar novamente? Sim! Não, tenho de viver. Talvez ainda haja esperança. Talvez um dia eu receba um nome, um reflexo verdadeiro, um que chore feliz, não que ria da própria desgraça.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Derrame-se

Como se não fosse clichê
Derrame-se em mim como um rio
Sem medo de ser tão feliz
Desague no mar do meu ser
Não te prendas num leito qualquer
E nem tente ir contra a maré
Se a corrente te manda pra cá
Coração tá gritando aí

Chega mais, enquanto se inclina na foz
Só faz aumentar tua voz
Que diz pra cair no meu colo
Se joga, anda, vai logo
Que eu quero sentir o teu doce
Pra acalmar o meu sal
Pra aquecer o ondular
E não ter início, muito menos final

Como se não fosse clichê
Derrame-se em mim como um rio
Sem medo de ser tão feliz
(...)

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Judite

Pô, Judite!
Vai me deixar sozinho nesta merda,
só porque perdi o emprego,
só porque te traí.
Na verdade eu nem te traí, mulher!
Só fiquei com outra moça,
mas em meus pensamentos,
era você que eu habitava.
Judite, não dê tapas em meu rosto,
não debruce na janela,
não, Judite!
J
u
d
i
t
e
!
!
!

Pan

É essa vontade de tirar de mim
Tudo o que me pesa
Mas me leva pro alto.
Entende-se: Saber,
É rir por entender.
Chorar por conhecer.
Não que eu seja o sábio,
Mas talvez eu já saiba
O suficiente pra não ser
alegre.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

A moça

A moça
Era de Deus
Até que o homem a largou.
Agora ela não é mais de Deus.
Mas de vez em quando pede a Ele que o homem volte.
Ele não responde.
Ela não acredita muito.
Acha que Deus é feito o homem.
Acha que Ele foi com o homem.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Sobre a vida e os desdobramentos dela

Dobrei a vida em oito vezes
Como se fosse impossível.
Demorei em fazê-lo,
Mas fiz, enfim.
E agora estava dividido,
Descarnado, desguarnecido
De totalidade.

Desdobrei a folha:
Não havia nada escrito,
Mas havia marcado, ferido,
Na iminência de rasgar.
Mas viver desdobrado,
Mesmo que posto em perigo,
É grande opção que escolho,
Viver sem olvidar o vivido.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Solidão na perspectiva de um numeral

Uma vez o Um,
ou um qualquer,
resolveu gritar ao mundo a sua indignação.
Era um só,
só um,
enquanto uns outros eram dois, uns três, ou até incontáveis.
Queria dizer ao mundo que abdicaria da existência:
Viraria então um zero.
Subtraiu-se o um,
anulou-se,
morreu.
Mas continuou sendo um, só,
Um zero!

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Auto estima

Me vendo:
Ou eu tô na frente do espelho
Ou tô encarecendo

Os dez anos de Otávio

1
Otávio
Acordou um dia,
Sem acordar.
Tava tudo escuro.
Otávio de repente,
Percebeu-se cego.
Perdeu o que mais gostava:
Os desenhos, as imagens,
Videar a vida.
Perdeu o fusca, a sua casinha,
Diogo, o cão,
A ruazinha de terra,
E papai e mamãe.
Mas não ficou muito preocupado,
Talvez por não entender,
Talvez por ter um presságio.
Tudo que dorme, acorda!

2
Otávio, dez anos depois,
Acordou de vera.
Esfregou os olhos
E pôde ver enfim.
Mas não poderia recobrar tudo:
Não havia mais fusca, e agora morava num arranha-céu,
A cidade corria,
Diogo tinha ido, e o cão havia
morrido.
E papai e mamãe
(Irreconhecíveis!)
De cabelos brancos
E rugas na cara.
Mas não ficou muito preocupado,
Talvez por entender demais,
Talvez por ter uma certeza,
Tudo o que acorda, dorme!

terça-feira, 7 de setembro de 2010

O amor e o divino

É de embolar o peito
ver você à luz de uma lâmpada qualquer
É de azular o mundo
Um amor que não responde à lógica comum
é de ser
e só

É de embolar o peito
dessa vez sem jeito por não ter você aqui
É de acinzentar os quadros
se a parede não ostenta um oceano azul
por eu ser
tão só

Mas como será que pode uma coisa
ser outra em uma mesma vez?
Como pode um
ser três?

É de me encher de graça
Essa despretensão que me faz levitar
É de me queimar a pele
quando à meia-noite tomo um banho de sol
desfazer
um nó

É montar quebra-cabeça
quando se encontra alguém pra acompanhar
É pra compensar os erros
E deixar segredos pro lado de lá
Apertar
o nó

Mas como será que pode uma coisa
ser outra em uma mesma vez?
Como pode um
ser três?

domingo, 5 de setembro de 2010

Amanhã de manhã

Antes de ler este texto, é necessário que se ouça a canção Vai(Menina amanhã de manhã) de Tom Zé. Youtube



Chegou! Chegou! Amanhã de manhã hoje é agora. E como prometido, num instante repentino ouviu-se um estrondo estranho. Era alto, porém não perturbou ninguém. Era como uma bomba atômica confortável. Todos os habitantes daquela cidade, exatamente à mesma hora, acordaram. O sinos das igrejas tocavam, do alto dos sobrados as janelas se abriam, e na rua de paralelepípedos as pessoas timidamente se aventuravam. O sol raiava com esplendor, mas se escondia por trás do nublado. Não fazia frio nem calor. O movimento aos poucos foi crescendo, aumentando, e às 10 da manhã os pombos estavam em polvorosa enquanto a cidade pulava. Pessoas rodopiavam nas praças, com uma chuva de bons-dias e como-vais. Inexplicavelmente, a felicidade tinha desabado sobre todos os homens daquela localidade. Todas as pessoas, simultaneamente, tinham atingido a plenitude de espírito. A cidade, antes com suas ruas coloridas neutramente, sempre em tons de cinza e pastel, começou a tomar cor: As pessoas, todas, decidiram pintar suas casas das mais diferentes cores. Lares sendo pintados de rosa, azul, verde, e até amarelo fosforescente. Os pintores que ganharam dinheiro com a empreitada, distribuíam-no entre pedintes, e compravam toneladas de pães para o alimento do próximo. Enquanto as trombetas tocavam, os padeiros, enriquecidos, compravam obras de arte que os artistas - ah! os artistas! Pintavam com perfeição a felicidade - desenhavam e esculpiam. Os menestréis cantavam nas esquinas canções de amores concretizados e plenos, as pessoas batiam palmas e jogavam moedas.

Dionísio saltitava entre os botecos da cidade. Ninguém estava bêbado, ninguém necessitava de esquecer de nada. Nem precisavam de estar, estavam embriagados com a felicidade que desabara há alguns dias. Dionísio tinha medo, as vezes. Medo dessa felicidade ir embora. Lembrava-se de um dos menestréis que cantava "Tristeza não tem fim, felicidade sim". Talvez isso fosse verdade. Saiu pelas ruas a olhar as pipas no céu, bailando um baile graciosíssimo. Teve medo, tentou fugir daquela felicidade evidente, pois o fim dela seria muito doloroso, se escondeu, mas não pode escapar à outra das suas investidas: Embaixo de sua cama, onde se escondia, Dionísio presenciou as formigas trabalhando.
- Saia daí Dionísio! Venha almoçar!
- É pra já Dolores.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Vaso Chinês

é caro
mas quebra igual qualquer outr...
cuidado moleque!
(sua onomatopéia favorita aqui)

O Mergulho, o Poema.

1
O viver é um poema:
Tem início, meio e fim.
Quem começa e quem termina,
quem afasta e aproxima,
quem regula e desatina,
é o tempo.

2
O relógio marca o que?
Não me venha dizer: "O tempo"
Pois tempo é coisa incontável,
temperamental, inconstante.
Não há como concentrar o tempo
num ponteiro de relógio:
Ele foge, não pára.

3
E eu vi. Vendo enfim,
mergulho nesse tempo.
Como mergulho no amor,
na dor, no sofrimento,
na esperança, na luta.
Como mergulho no querer,
assim o faço na disputa.
Afogado enfim, todo o tempo tenho.
O tempo todo de viver,
o Poema.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Amor definitivamente platônico

ah
me apaixonei mais uma vez
mas agora não foi por alguém
foi pelo ser
mulher
perfeição.

sábado, 28 de agosto de 2010

Assassínio Racional

Pois é. Assim foi. Discutiu, discutiu, e perdeu a razão, o pensamento, o fator vantajoso da perfeição moral. Não pela emoção, mas sim pelas suas conclusões. Um tiro acabou com tudo. Infelizmente ele não teve raciocínio para calcular essa razão: pôr um peso de uma morte em um lado, e o peso de se estar leve, livre de uma disputa pela razão. Não a razão que pesa, a razão que dá a vitória. Mas, que tipo de vitória seria essa? Uma vitória pela razão, sem razão, pois ele não havia calculado a razão. Como se ele fosse raso, profundamente raso, razão. E estava lá o corpo no chão. Pura e simples atitude contraditória da lógica matemática, da lógica moralística. Pobre homem. Tanto o que morreu, quanto o que ficou vivo. Não sabe este que a lógica é de cada um? Que acrescentamos coisas à lógica com o passar dos anos? Deitar alguém para sempre era muito lógico para ele. Agora não é mais. Talvez a fé separe para nós lógica além das limitadas razões.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Ela ligou dois anos após a partida

Eu ainda tô aqui:
mordendo caneta, falando besteira
e contentando o engano
com arco-íris de mangueira.
Não mudei
(só um pouquinho)
E você, que viajou por aí,
viu tanta coisa chover
viu tanta água subir
onde e quem você tá?
Eu? Eu ainda tô aqui.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Descoberta

Cada dia é uma nova!
Descobri as descobertas!
Quando descobrimos o coberto,
vemos que este era
justamente
outro cobertor.
Cada dia é uma nova!

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Jorge e as mudanças imperceptíveis

Abrem-se as cortinas. Sim, isto faz parte daquele meu irremediável costume de começar histórias com períodos extremamente curtos e sem sentido aparente. Acho belo - aí vai outro período curto. E talvez eu goste disso porque creio que as nossas transições são feitas num período curto. Há quem diga que "não se torna isso do dia pra noite, não se faz aquilo instantâneamente", por causa disso, ou daquilo, ou daquilo outro - que é referencial dogmático. Pois eu digo que não: Todas as mudanças são feitas num período extremamente curto. Esse período se revela tão curto, que acaba por se disfarçar na corrente de mudanças, nos dando a impressão de que nada se faz do dia pra noite. Mas na verdade deixamos o passado para trás e ignoramos as consequências disto com a mesma facilidade que nos recusamos a mudar, por medo desses mesmos reflexos. Percebemos esse período curto quando moramos numa cidade voltada para o mar. Jorge mora numa cidade voltada para o mar. E como se não bastasse, se permite viver na avenida beira-mar.

Onde começa o mar? Onde termina a cidade?

Pois o mar está revolto em nossos eletro-eletrônicos. Trocamos de tevês e computadores e microondas muito rapidamente. A maresia invade a cidade, o mar invade o vazado dos prédios, enferrujando e deteriorando os nossos metais.
Abrem-se as cortinas e Jorge olha a avenida. Sinais, faixas, pessoas no calçadão, automóveis. Para ele explicar isso era fácil, pelo menos era o que pensava, ou não pensava, enquanto segurava a caneca de café que exalava uma fumaça fraca. "Ali começa o mar, na areia, horas mais em cima, horas mais embaixo, a maré dita seu começo como um general dita o posicionamento de suas tropas." Mas ele na verdade não podia explicar. Para ele, as mudanças da maré se exibiam na sua lentidão. Ele dizia que sim, e eu já me nego a compactuar com Jorge: Essas mudanças são feitas num período curto. Num milésimo de segundo, no exato momento, a maré tinha ficado imperceptivelmente mais alta. Mas quem poderá dizer que não está mais alta? Quem poderá dizer que não existe Deus? Creio eu que Ele tenha iluminado Jorge no momento exato. Tentou abrir a janela de metal, não conseguiu. Ali estava o mar, tinha se infiltrado em sua casa, no enferrujado de sua janela e em todos os seus eletro-eletrônicos. Ele percebeu que pisava no molhado metafísico do mar. Jorge sentiu-se alegre, a água estava fria, subiu-lhe um calafrio, um nervoso na espinha dorsal. Precisava sair. O carro dele não pegava. Talvez fosse o frio incomum que fazia naqueles dias, talvez não, nunca entendi muito bem os automóveis. Ele precisava de um carro novo. Sua vida também não pegava, precisava de uma nova, mas infelizmente, vida só se pode ter uma.

Jorge andava abstraido pelo calçadão da praia. Estava mergulhado no mar que descobrira há pouco. Encontrou um parque, com as barras do portão enferrujadas. Estava ali, era o sinal do mar, de que ele existia ali. Deitou-se na gangorra. Não via o céu direito, os prédios lhe davam esta visão defasada, irreal, parcial, do céu nublado que reinava. Era a cidade. E a cidade Jorge? Com o que lhe parece a cidade? A visão íntima dele era que o mar não se encaixava na cidade. Nunca havia percebido que morava à beira-mar. Não percebido óticamente, mas percebido com a alma, com a idéia, a razão. Para ele, cidade e mar não poderiam coexistir em paz: Ou o mar destruía a cidade, ou a cidade ao mar. Nunca havia percebido que o mar era o que havia erigido o seu prédio. Embora vivesse rodeado de construções - as constantes mudanças! - só atentava para a estaticidade do seu edifício. A cidade é como o mar, Jorge. É como a maré. Não se pode dizer onde começa, onde termina. A cidade envolve os seus tentáculos onde quiser. Mas, e no mar? Lá está a plataforma de petróleo e os navios cargueiros. Quem poderá dizer que a cidade não existe lá? Jorge olhava a plataforma. Era um prédio como os outros. Os prédios em construção - constantes mudanças! - o cinema desativado, os bares, o metrô, a cidade mudava numa rapidez novamente imperceptível. Era o curto período da hora útil, que fazia a cidade pender para um lado, a maré descer, e a hora inútil subia o mar que a plataforma enferrujava. Jorge sorriu, pisava agora no concreto. Mas era um concreto abstrato. Quem dera todos os dias as cortinas abrissem como hoje se abriram.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Culinária

enquanto está na manteiga a cebola,
frito a calabresa,
espero pacientemente na mesa.
(...)

porque como é que cozinho,
porque me esqueço é que como,
do problema da vida
e do problema do estômago.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Imparei na retroguarda
salzinhei as quinas
duma cidade qualquer
não me importunôme
não quero saber
só mimporta o amor que predi
entre os pérdios desta rua.
E agora só mirresta
salzinhar as quinas
com apeito no pêrto.
C'est la vi mon ami!
Não posso nem xorá aqui.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Oração

Não me deixes ver a ti.
Continue a se esconder atrás
do verde em nós
no ver de mar.
Que minhas palavras não possam ser
simples orações dispostas
à mercê da gravidade,
mas que seja a oração
direcionada ao céu,
uma conversa que ultrapasse
a malha de cumulus nimbus.
Não afaste de mim os cálices,
que eu os beba, se assim quiseres.
Dê os que eu mereço,
Deus,
que preciso
pra aprender,
crescer
e ir te encontrar,
escondido...

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

São Francisco

E os passos, engendrados pela mente
dão vida ao solitário apartamento
que dá as costas pro mar
pra ser mais barato.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Texto com fins de escândalo mal sucedido (com todas as interpretações possíveis para a ambiguidade)

Pois é. Resolvi escrever e causar um escândalo. Um grito. Ah! Eu ouço, vocês não ouvem, pois não há ouvidos em olhos, muito menos boca em palavras. Gostaria de escandalizar tanto quanto me escandalizaram. Acho que isso não me é permitido. Talvez a vontade me traga a duas extremas possibilidades: A de escandalizar muito mais, por achar que meu problema é o maior de todos, e dosar de forma incorreta a minha vingança, esquartejando alguém; Ou posso suavizá-la, não por querer, mas por ímpeto automático da piedade inerente ao meu ser, talvez me arrepender depois, tentar fazer de novo e... enfim, voltamos ao esquartejamento. A vingança é fora de cogitação, porque de forma alguma é justa. Só seria justa se fôssemos ideais. Quando se pisa num pé por vingança, pisa-se muito mais forte. E se não piso, não machuco, e vá lá, ninguém quer levar desaforo pra casa.

Muito bem, resolvi escrever um texto. Que maravilha, uma descarga mental, um qualquer-coisa degenerado que só exibe aos poucos transeuntes a minha falta de resolução comigo mesmo. Quer saber? Que se dane. O texto já está escrito mesmo, não tem como apagar, até porque ele não está lá tão ruim. Mas aí me resta uma dúvida: Será que alguém vai ler? E entender? (Quanta pergunta retórica...) Não faz sentido nenhum se ninguém entender, logo, o texto estaria uma grande merda. Mas não está.

Fotos, eu olhei hoje dezenas e dezenas de fotos. Me deu vontade de me vingar. Mas não dá, porque eu estaria sendo alguém ruim. Quanto maniqueísmo, hein? Olhar pra quem te escandalizou e achar que essa pessoa é ruim. Ruim? Essa palavra beira o ridículo. Um desvairado juízo de valor, que aplicado a seres humanos é inútil. Há certas coisas que eu entendo mas me nego a aceitar. A negação é culpa minha. Já devia ter me acertado.

Como irei me acertar? Sem me vingar? Há de haver um jeito! Causar dor no outro, ou puramente satisfação ao meu ser! Existe algo me rasgando por dentro, que tal? Já tentei de tudo. Nada resolve. Comecei a achar que é patológico. Que se explodam as patologias, eu só quero ficar bem! Bem comigo mesmo! Em paz! PAZ!
Paz que alguém me deu, e depois me tirou. Sem nem perceber, sem motivo. Porque se houvesse um motivo, talvez se tornasse no mínimo plausível.

Mas há um jeito de voltar-me à paz. Morrendo. Por isso me matei. Hoje, dia 02 de maio de 1996, com uma dose de qualquer coisa. Engasguei, agonizei, e fui. Espero que nos traga paz.

Um homem foi encontrado com a seguinte carta, em casa de seus pais, trancado no quarto. A televisão estava ligada, sem sinal, e ele estava jogado ao chão, ainda vivo. Foi reanimado, e continua morto, vivendo até o presente dia.

(texto fictício)

sábado, 31 de julho de 2010

Cotidiano

Enquanto isso, na varanda
exposto está o cotidiano extraordinário
aquele que nos adoça numa surpresa normal
o cotidiano infalível.

sábado, 17 de julho de 2010

O Banco Alto

De todas as coisas no mundo que me dão pano pra manga, a maior de todas elas, indubitávelmente é um ônibus. Porque no ônibus eu tenho os meus insaites, tenho as minhas idéias. A Pendotiba, empresa que monopoliza o transporte público aqui de Niterói, já partilhou das minhas maiores alegrias, das minhas menores tristezas, dos meus pensamentos, das minhas decisões. Não sei o que seria se andasse de táxi. Não seria o mesmo. Tive idéias, tive falta delas, li, amei, cuspi, ri, chorei, tudo dentro de um ônibus. Mas tudo isso não é nada, diante da tamanha importância que os ônibus têm em minha vida.

Foi hoje que eu vi, e me lembrei. Pegava o ônibus para a escola, para ir me preocupar com notas e recuperações, quando entraram porta adentro uma mãe, e seu filho, de uns 8 anos, e ela o carregava por obrigação. Não era daquelas crianças que anda subordinadamente ao lado da mãe: ele deveria ser literalmente puxado. Eu estava sentado no assento mais alto, aquele assento que é elevado por causa das rodas do ônibus. Havia entrado no ônibus e me dirigido diretamente a esse assento. E a criança, arrastada, soltou um grito no meio do ônibus:
- Ali mãe! Ali! No banco alto! EU QUERO SENTAR NO BANCO ALTO!

Voltemos aos dias de minha infância:
- Ali mãe! Ali! No banco alto! EU QUERO SENTAR NO BANCO ALTO!

Sim, eu também queria, e ainda quero, todas as vezes que entro no ônibus, sentar no banco alto. Mas por que?

POR QUE PREFERIMOS O BANCO ALTO?!?
Nunca entendi. E em meio a tantos risos, choros, amores, ódios, cuspes, escarros, leituras e devaneios eu sempre me perguntei isso. E é o banco alto, e de preferência o da janela, que dá pra encostar a cabeça e sentir os respingos e o vento. São 18 anos de dúvida. Talvez seja uma questão de vida inteira, uma monografia de mestrado - que defenderei com unhas e dentes. Isso tudo me atacou hoje e me levou até o Gúgôl. "Por que preferimos sentar no banco alto do ônibus?" foi o que eu perguntei ao Dr. Sabe tudo, e do alto da sua sabedoria ele me mostrou que eu não estava só. Comentários e mais comentários, reais e ficcionais, a respeito da preferência pelo tão aclamado assento. Muitos comentários, muitos relatos, mas nenhuma resposta. Isso é caso de pesquisa antropológica, não brinco aqui caros leitores. Talvez seja pelo desejo humano de destaque, ou pelo mesmo instinto natural de estar numa posição privilegiada, que te permite avistar melhor o ambiente que te cerca, cheio de riscos e ameaças. Eu sento por nostalgia. Por falta do que fazer, gosto de coisas que me lembrem dos meus 5 anos. Mas não é só por isso, a vontade arde, quando vejo o banco vago, a janela vaga, sem ninguém do lado! Tomo o assento e me acalmo. Mas se não há mais lugares nesses mirantes do transporte público, fico um tanto desapontado. Dá até vontade de falar:
- Ali, no banco alto. Queria sentar no banco alto.

Estarei fora pelas próximas duas semanas. Sei que não farei falta, mas é só pra avisar mesmo.

terça-feira, 13 de julho de 2010

A jóia

Franco tomou sua xícara de café e olhou no além-mesa, parada numa dessas canecas que todos nós invejamos pela suavidade e sutileza de suas cores, uma mão que ostentava um anel singular. Não era um desses genéricos, com diamantes dispostos a esmo, sem pensar no futuro ou no passado. Era uma jóia meticulosamente forjada: Um enlace de ouro comum e branco, com uma sincronia inigualável. Causava a impressão de que a separação entre os metais nunca existira, que eles sempre estiveram assim dispostos, encaixados. De certo havia vezes em que se olhava para o anel, e não se podia perceber que eram dois tipos de ouro, mesmo que a cor fizesse esse detalhe aparente. Dois pequenos diamantes estavam encravados na parte superior, um em cada pólo do anel. A jóia era perfeita. A mão era perfeita. Era como se o anel tivesse sido feito para a mão, e a mão para o anel. Como se o ouro comum tivesse sido feito para o ouro branco, e o branco para o comum. Como se Franco se encaixasse em Júlia, e Júlia em Franco, e apesar das diferenças, eternizassem a união. Heterogênea, porém homogênea. Que jóia perfeita.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Gerundiando

Ando
Aprendo
Vagando
Vendo
Ouvindo
Vivendo
Sentindo
Amando
E ando
ando
num gerúndio
sem fim
eternizando
o aprendizado
aperfeiçoando.

sábado, 10 de julho de 2010

Coração

Coração
coração
Coração
coração
Coração
coração
e só.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Chocalho

Chacoalha Chocalho,
Chacoalha e chapisca
Os torrentes metais da gafieira
Que oram, choram.
Mantém vivo o samba, chocalho
Não chora, chama
Ritmas, amas.
Te escondes atrás
Das graves cordas,
E sucinto sambas
Sambas
Chambas.

sábado, 3 de julho de 2010

Deus

Adoro a palavra Deus. Por isso falo muito ela. Não que eu fale em vão, até por que Deus está em tanta coisa que remetemos a esta palavra mesmo que indiretamente. Deus é muita coisa. Deus é o divino, que me liberta, que te liberta, e liberta a quem Ele quiser. É Ele que me deu a vida, e deu a graça dela. A graça. Deus é interjeição, é susto, é alívio e acompanhante dos que vão com ele. Deus é conforto. Por isso uso o nome dele no conforto de meus poemas. E tenho propriedade em usá-lo. Uso-o para algo que é bom, é arte, é belo. Há quem use o nome dele pra fazer riqueza pessoal, ou manobrar fiéis, que são dignos de graça, e vítimas da maldade de quem faz mal uso dessa palavra. Ê palavrinha boa! É sonora ainda por cima! Deus... Deus... Soa como um vento, que é forte no início, mas suave no fim. Deus faz jus ao nome dele, sempre fez, sempre fará. E como todo bom vento, não se pode ver, mas se pode sentir: No próprio vento, ou no verde bom que nos cerca. Deus.

quarta-feira, 30 de junho de 2010

Mixtape Feminina

Aí está, seguindo o exemplo do meu amigo Tiago Dias, uma mixtape, agora só com músicas que contenham nomes de mulher. Recomendo todas, maravilhosas. (As mulheres e as músicas)

1 - Polythene Pam - The Beatles
2 - Roxanne - The Police
3 - Layla - Cream
4 - Aline - Los Hermanos
5 - Billie Jean - Michael Jackson
6 - Dona Olympia - Clube da Esquina
7 - Grace Kelly - Mika
8 - Dona Cila - Maria Gadú
9 - Dani California - Red Hot Chili Peppers
10 - Adeus Maria Fulô - Mutantes
11 - Ruby - Kaiser Chiefs
12 - Sheena is a Punk Rocker - The Ramones
13 - A história de Lily Braun - Chico Buarque
14 - Angie - Rolling Stones
15 - Ana's Song - Silverchair

As vitórias.

Fiquei em 18° lugar no concurso de contos do Gato Sabido. Meu conto será publicado. Todos vocês já devem imaginar como estou feliz, dado que meus primeiros períodos estão extremamente curtos. Como no conto. É. Isso ai. Tô feliz mesmo, tanto até que tô informal demais. Mais do que o normal.

P.S. Agradeço ao Stefan que revisou meu texto, e a Carol por ter me falado do concurso. Obrigado.

sábado, 26 de junho de 2010

Hoje

Hoje, todos os meus planos
resolveram dar errado.
As pessoas sairam
e eu fiquei.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Meu aniversário de trinta e um anos

Foi justamente nesses dias que eu senti falta de um amor. Não necessariamente algo concreto, um amor-qualquer-coisa, só pra enganar a razão: Estou farto dela. Aquele amor que você só precisa achar que o outro gosta de você, quando na verdade ele nem se ocupa em pensar na tua existência. Bolsas de valores e mercados e músicas e talvez outras pessoas povoam a mente dele. Sim, necessito encarecidamente dum amor, por que na quinta passada lembrei do meu irmão, e de como o fim dele foi trágico. Linfoma. Ele era o único que me fazia não precisar de amor de mulher, como se tivesse uma propriedade sobrenatural que supria todas as minhas carências e deficiências, enganando-me, e me fazendo perceber que eu era perfeito. E agora ele tinha ido descarga abaixo, e me deixado sozinho, percebendo que não era perfeito coisa nenhuma. Foi justamente nesses dias que eu senti falta de meu irmão, de um amor. E agora confesso que já não sei mais se preciso de um amor pois sinto falta de meu irmão, ou preciso de um irmão pois sinto falta de um amor. Acho que um pouco dos dois, pra enganar a razão. Engano-me pensando que um amor assim vai me saciar de tal forma? Talvez sim. Mas talvez não, e prefiro continuar acreditando nisto.

Foi justamente nesses dias que eu me lembrei dum amor, e de como havia corrido e corrido contra o vento, me cansado por um faz-de-conta qualquer. Sim, eu necessitava de me cansar em vão, de povoar a mente, de me ocupar com as coisas fúteis e superficiais, pois o profundo já não me dava mais prazer. Lembro-me dela. Nem era tão bonita assim. Ou era, e eu não quero mais que seja. Lembro-me de quando esboçou corresponder, e de como o meu mundo passou de algo concreto para uma festa debandada, de fantasias e ilusões, palhaços e balões e arco-íris e nuvens. Todos os movimentos, mesmo os mais bruscos, se tornaram um espetáculo gracioso diante dos meus olhos. Casamo-nos, tivemos filhos, eles cresceram, eu tive um carro, uma casa, uma rotina só minha e um trabalho só meu, um salário que administrava com fervor, e que sempre sobrava para agraciá-la com vestidos caros e bolsas caras e múltiplos sapatos... como sustentava com alegria as suas vaidades! E, de repente, vi que tudo isso era mentira. Não havia sapatos, vestidos, filhos, carros ou arco-íris. Voltei a minha insignificância, ausente de qualquer função, nupcial ou social. Ela apenas esboçou corresponder. E esboços nem sempre saem do papel. Agora contento-me em necessitar de esboços apenas, do alto dos meus trinta e um anos, sozinho, só.

terça-feira, 22 de junho de 2010

Fardo

Vem, que o dia já morreu
sorriso não há mais
Não há mais alma viva, vista
que trago satisfaz
Vem, e traga também
me expulse do teu peito
e eu, sumo no ar
falta não farei
até você perceber
a falta que trago faz
até precisar de mais
de mim.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Medo

O medo é escuro.
Nunca sei se é medo,
ou se é dor.
Pois o aperto
é um só.
Mas as vezes eu sei.
Medo é escape, instinto,
medo é ser menor.
Dor é aviso, instinto,
dor é estar melhor.
Dor é pra passar,
medo é pra matar.

domingo, 20 de junho de 2010

Acerca das fotografias

Fotografias me fazem mal.
Fazem mal a quem vê.
Pois se não somos nós a sorrir,
estamos nós a chorar.
E se somos nós a sorrir,
agora não sorrimos mais.
Trazem consigo as lembranças
de um tempo que foi bom.
Ou fingidamente bom,
mas isso não importa,
pois enquanto fingimos é verdade,
e fingimento só se torna no fim.
Olha-se o sorriso
- seja ele próprio ou não -
e o aperto no peito é inevitável.

Portanto proponho uma revolução
na forma de fotografar os momentos:
Que seja uma criança a chorar
por não saber ser.
Que seja alguém com fome
e que vai se saciar.
Que seja alguém doente
na iminência de sarar.
Que seja uma briga
que logo fará par.
E assim podemos nas fotografias
momentos ruins assistir,
para que sintamos tristeza
na iminência de sorrir.

sábado, 19 de junho de 2010

Angústia

ai meu deus do céu que angústia que me pegou
me arrastou pelo beco da mente
me afogou, me afogou
em pensamentos
não lembro nem mais onde eu tava o que eu fiz
com quem falei, meu deus do céu, o que será
eu nem bebi, eu nem chorei, eu nem corri
nem me matei, nem fui pro céu
Mas que inferno!
Ai Deus, o que será que me aflige, há tanta coisa pra sorrir
estou aqui, cá estou, olhando em volta
procurando um motivo, um biscoito
umas cadeiras, uns amigos,
uma tevê, algum programa e muita conversa
e eu ainda não sei, por que fiquei assim.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Motivos

Não tenho que te dar motivos.
Motivos já te dei demais.
Agora guardo em mim minhas desculpas
E faço como qualquer faz.
Já te dei razões suficientes
Pra montar razões do que eu fiz.
Se tristeza é o que me restou
Me restou tentando ser feliz.
E nada mais peço a ninguém!
A não ser um conselho banal,
Uma ou duas medidas de café
Pra curar qualquer doença astral.

Não tenho que te dar motivos.
Motivos já te dei demais.
E foi tentando ter razões pra vida
que perdi minhas razões pra paz.

domingo, 13 de junho de 2010

- O mundo é de cor.

Mas se o mundo é de cor, vem me explicar com quantas cores se faz
a canoa que na vida dá fim. Se mundo é branco de barco,
e no mundo me embarco, qual a cor da passagem?
Tá com tom de viagem, coisa passageira,
cara de cinza-relógio, que faz
num esconder do verde-mar
da vista, passar,
ir, morrer,
findar
finar.

Ignorância

Tem dia que a gente pensa que é o mais profundo
Só por que cruza umas esquinas no pensar
Ai a gente vê que nem tudo é vida, social e melodia
E que tem muito mais local pra cruzar.
Tem travessa alameda rodovia ciclovia
Tem beco sem saída com saída viaduto
avenida parque viela linha amarela
e vermelha e a cor que Deus quiser.
Pra que cruzar isso aí tudo?
O que tem de mais profundo
É descer um piano de cauda
do sétimo andar do edifício

Punho

Seu punho é vento.
Vento que soprou em mim,
mas não como rajada, não,
como brisa, carícia.
Seu punho é vento.
Vento inspirador,
que como vento,
sopra e bate em quem quiser.

Segurei tua mão
Com a caneta em punho.
Mas meu punho não é vento,
muito menos instrumento
que te guia.
Segurei tua mão.
Mas ela nada
nada escrevia...

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Ah, Alegria!

Alegria
é dia que passa
é olho que pisca
é vida que para

Alegria
é prenúncio
é anúncio
é futuro

Alegria por quê?
Se da vida o que nos resta
é destino de flor?

Alegria por que
A vida é o que nos leva
Pr'aquilo que nos resta:
Deus, amor.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

O sol, a lua, o Bem-te-vi

(inspirado em um verso da minha amiga, Mari Aylmer.)

Da janela do meu quarto olhei,
e uma das coisas mais prazerosas vi:
O sol, a lua e o bem-te-vi
envoltos numa discussão.
O sol, sempre enérgico,
gritou que era dos astros o maior,
o mais quente, e assim, o melhor
e que esquentava o bem-te-vi.
A lua, na sua timidez,
Nada fez se não concordar
com uma chacoalhada de cabeça
e um diminuto "É".
- Ei!!
Disse logo o bem-te-vi
- que nem astro é -
Resolveu ir de encontro ao astro rei.
Bateu as asas, fez barulho,
voando e esbarrando em todas as folhas
pra fazer confusão.
O bem-te-vi era mesmo um valentão.
Com medo de que o pássaro
pudesse voar até ele
e descobrir seus maiores segredos,
o Sol se recolheu atrás das montanhas verdes.
A lua então, saiu sorridente,
como que liberta.
O bem-te-vi ficou contente,
e se escondeu não sei aonde,
sabendo que uma hora
o sol ia voltar.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Briguei

briguei comigo mesmo.
agora estou só dentro de mim.
nada mais se comunica:
se quero andar, mexo os braços,
se quero pensar, durmo.
esse meu eu,
pirracento.

foi no sábado passado.
a gente gritou, se desentendeu
e ainda não voltamos a nos falar.
esse poema é só pra desabafar.




(post de n° 100, palmas)

domingo, 30 de maio de 2010

Concha

E eu mais uma vez
me fecho na minha concha
jurando que não abro mais.
Pra ninguém.

sábado, 29 de maio de 2010

Era uma vez

Pais irresponsáveis
que queriam que o filho aprendesse
a mentir.

Quando ele cresceu
e os pais já haviam passado toda
a experiência,
Perguntaram-no:
- Filho, aprendeu a mentir?
E ao que o filho respondeu:
- Não mamãe.
Perceberam que foram muito
bem sucedidos.

O pai no entanto,
duvidou ser verdade a mentira
e perguntou:
- Aprendeu mesmo a mentir?
E quando ele respondeu:
- Sim papai.
Os dois viraram cabide.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Aventura

Branco tinha uma vida ordinária
Um carro popular
Uma conta corrente secreta
Uma amante e dois filhos
Um homem e uma mulher
Tinha passado no vestibular
Tinha terminado a faculdade
Entrado num emprego ordinário
Ganhava um salário normal
(até mais do que deveria)
Comprou tudo usado
Inclusive a sua esposa
E com esta tinha brigas normais
Com as mesmas palavras ordinárias
- ordinária! -
E o mesmo fim água-com-açucar
que logo salgava
Mas de repente
Branco morreu.
(De forma ordinária.)

Não dá

Falta
Privacidade nas idéias.
Todo mundo tá me vendo.
Assim não dá pra ser
Poeta.

domingo, 23 de maio de 2010

Auto Sugestão

Eu boto açúcar na água
E deixo a imaginação gritar:
Suco de Limão.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

O riso

Eu ri.
Ri por necessidade.
Ou por falta de qualquer esboço
de sentimento, sem esforço brutal.
Aquele riso, que se dá
mas se toma logo após.
Rir: tapar a dor atroz.
Que há assim no nós?
O passado que não muda.
Choro. O riso de vera.
Eu só ri.

Você riu.
Riu por cinismo.
Ou por falta de compaixão,
sabendo o dia que chorei então.
Aquele riso, que se empurra
goela abaixo de quem tímido sorri.
Rir: É só pensar em si.
Que há assim no nós?
O passado que não importa.
Choro. O motivo do teu riso.
Você sorriu.

domingo, 9 de maio de 2010

Pingos nos is

Triste foi o dia em que eu fui desabar.
Ah foi... sim.
E eu já sabia que essa hora ia chegar:
Nada mais me prendeu,
Pois tudo me pesou,
E assim fui a primeira na corrida pra bater
No chão.

Não há pr'onde correr,
No breu dessa dura pavimentação.
Contento-me em esperar,
Subir e ficar
Latente numa nuvem clara de verão.

E assim vou, me explicando,
Repetindo, Retornando.
Espero que esteja assim
Claro, pra você.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Re-fórmula

Há de se querer
Pode-se esquecer
o céu
(sim o Tal, infindo)
Esquece-se sim
Há de ser perto
E terno não se vende

Basta se querer
e não querer a si
Crer se assim
Puder.

Quão lindo é.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

15 de maio em Icaraí

(Um ano após a separação)

Cláudio:
Parece mais jovem.
Mas isso não te faz mais bonita.
Talvez. Não sei.
Ah, também não quero saber...
Alguém sabe? O que?
Mais jovem foi que me juntei
com você, Fabiana.
E eu olhei você daqui,
mais velho, agora.
A andar calçadão afora,
como quem nada quer
pois tudo tem.
Tenho eu tal andar também?
Pra ti? Não sei.
Ah, também não quero saber...
Alguém sabe? O que?
Um ano depois.
Dos dez anos atrás,
Será que já tens alguém?
Será que me traria a paz?
Ou outra senhora quererá matar,
Pela dor do nosso brigar?
Morri? Não sei.
Ah, juro que quero saber...
Alguém sabe? Por que?
Me queixo de tão bobo ser.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Teimosia

Teimosia é
fazer o que se quer
de refém:
Ou morre apenas você,
ou se vai o que se quer também.

sábado, 1 de maio de 2010

A guerra

(Fabiana joga a urna, com as cinzas da avó de Cláudio, da janela do décimo quinto andar do prédio.)

Cláudio:
Por que fizeste tal coisa?
Estás a delirar? Já deveria saber:
Me casei com uma louca varrida!
Completamente possessiva!
Concedi o meu domingo,
minha missa, meu futebol,
minha motocicleta, meu anzol,
minhas palavras, minhas cervejas,
minhas amigas, minhas certezas,
muito mais que meu tudo te dei!
Pra saber que me enganei!
Agora me privas do que restou de minha vó,
aquela santa, tão diferente de vossa mãe!
Jogou-a do décimo quinto andar...
Pra o que restou dela, não mais restar.

(Ouve-se um grito distante, e os dois parecem não se importar com aquilo, e continuam a discutir. Fabiana rasga a capa de um vinil do Elvis Presley, e lança o disco de encontro à parede, que se quebra em mil pedaços)

Fabiana:
Santa? Santarrona!
Maldita pecadora
era a vossa progenitora!
(Fabiana pega o disco "Abbey Road", dos Beatles. Num rápido movimento, Cláudio corre para se entrincheirar atrás do sofá novo.)
A tua família foi concebida
na prostituição! E você?
Te encontrei a vadiar pelo Grajaú!
(Nesse momento, Cláudio deixa a cabeça aparecer atrás do sofá, com a expressão raivosa)

Cláudio:
Vá tomar no...
(O barulho do vinil dos Beatles espatifando um vaso de porcelana abafou a última palavra dita por Cláudio. Nesse momento, Fabiana corre até a cozinha e pega um Pudim de Chocolate, e com a fôrma em punho, volta para a sala.)

Fabiana:
Olha cá, o pudim que te fiz!
Há duas semanas está na geladeira...
Não gostas de comer besteira?
Então, tome-as!
(Fabiana pega punhados de pudim e os lança aleatoriamente. Agora Cláudio está realmente bravo, e de sopetão vira o sofá de ponta a cabeça. Sua cara está vermelha. Ouve-se um som de sirene ao fundo.)

Cláudio:
Não te bato pois fui educado!
És uma mulher insolente!
Vadio é quem diz, pois você não trabalha,
fica em casa o dia todo,
vai a academia, malha,
volta pra casa e se deita no chão.
E não pense que não sei do Ricardão!
Pois aquelas gravatas que surgiram
no armário, não eram minhas!
Enquanto eu estou a trabalhar,
onde já se viu?
Ausento-me para te sustentar,
e tens a ingratidão de me trocar?
Desgraçada tu és,
Fez do meu amor castelo de areia,
na beira do mar.
Já se foram dez anos,
e só nos cinco primeiros
te pude aguentar!

Fabiana:
Te traí por que assim também o fizeste!
Achei que estava subentendido...
Tácito, implícito!
As várias que tens nas ruas,
conheço-as por nome e cor,
qualidade de cabelos e estilo,
e por muitos outros mais eu sei
das tais do teu harém.

(Na rua, uma senhorinha estava morta, com paramédicos a colocá-la na ambulância, e como a viatura obstruiu uma passagem, um motorista descuidado e alcoolizado bateu em outro carro. Fabiana e Cláudio ouvem o estrondo da batida e correm juntos até a janela, avistando a senhorinha, coberta com as cinzas da avó de Cláudio, e os paramédicos desnorteados.)

Assim terminou a batalha:
Cada um foi pro seu canto
Sem ter o que falar
Diminuiu-se à um diminuto pranto,
simultâneo.
Cláudio dormiu no sofá.

sexta-feira, 30 de abril de 2010

À Deriva

Folha qualquer eu vou carregar na beira:
O inverno já vai chegar...

Como a onda que vem pra me arrastar, profundo
na iminência...

Como formiga no mar, sem poder afundar e sem saber nadar
À deriva até o finar.

E os tentáculos do céu, acinzentados de medo
Ameaçam desabar.

A chuva que cai só faz me empurrar, ajuda
A nuvem me diz:

Se vá, pra nunca mais voltar.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Prosa prosaica

Me diz
antonio
Se a vida é o que basta...
Se existir é o que nos resta!
Não és tu
antonio
Grande conhecedor do tudo
que fala do nada
e fala de
antonio?
Ou cá, ou lá.
Porque não posso escolher
os dois, à pá?
Diz pra mim
antonio

domingo, 25 de abril de 2010

Depressão

(...)
Faz do músculo, coração.
(...)
Faz das palmas, mão.
(...)
Faz das almas, oração.
Não
Não.
Não!
(...)
(...)
Faz da mente, escuridão.
Sem fim
Sim!
Sim.
Sim
(...)
Faz do assado, assim.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Casa muito engraçada

Era uma casa muito engraçada.
Tinha tetos,
tinha chão,
penico e sacada,
mas além das paredes
e da beleza ostentada,
possuia uma família
plenamente desestruturada.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Não há nada neste poema
Cá está ele, vazio e sincero
- como tudo que é vazio -

Não há nada a esconder
Pois realmente não há nada.

É só um poema vazio.
Não quer dizer nada,
Não quer mudar nada
- como a maioria das artes -

Não há nada neste poema
Nada há neste poeta.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Resolução

- Dos sonhos todos, amigo, tomei um.
Um apenas, nada mais.
Nem demais.
- Mas ele não se realizou.
- Que farei eu, pois?
Tomarei outro sonho pra mim,
ou deixo tudo como está?
- Diga-me você,
já que não cabe a mim sonhar.
- Há o medo de falhar...
- Mas há vontade de tentar.
- É, isso há.
- Então sonhe em não sonhar.

domingo, 18 de abril de 2010

Aos tolos apaixonados

Vós sois motivo
da minha ironia.
(risos)
Dão conta de ser
aquilo que não seriam
caso estivessem
chagados, pelo costume
ou a solidão.
Engraçado é,
a falta de parcimônia,
as palavras, ditas sem consciência...
E quando ditas, de olhos apertados,
tangem a clínica demência.
Ah, dá-me um antídoto, por favor!

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Mais um

se entregou ao amor mais um
mais um se descuidou
consentiu a queda vã
e não mais se importa
não se preocupa em se preocupar
seus versos descuidaram-se
seus cantos desafinaram-se
e seus olhos foram cobertos
agora ele anda nas ruas à toa
na rua qual o nome mais lhe agrada
com um sorriso tolo e ao mesmo tempo
dono do mundo
até morrer o que se tem
tudo está tão bem
se entregou ao amor mais um

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Pé de ipê

Ipê:
É pé de quê?
É pé de não sei,
não dá pé pra saber...
Amarelo que só,
ri profundo esplendor
ouro que só cor é,
mas vale amor
e compra sorrir.
Ipê:
É pé de que?
É pé de não sei,
não careço saber...
Pois o apreço que dá,
o aperto que é nó,
faz da vida esquecer
e desabrocha em querer
ver, ipê.

Esmero

Faço o que quero.
O que quero, não gosto.
Se fizesse o que gosto,
não faria o que quero,
e se não faço o que quero,
não faço com esmero.

domingo, 11 de abril de 2010

Conservadorismo Poético

Diga quantos tempos me faltavam,
para que ao certo me programe,
e então evite o mal infame,
maculando os que me inspiravam.

Em dez tantos juro ser preciso!
Privar-me-ei da modernidade,
usarei canto de castidade...
Lembrarei de tudo que é inciso.

Cá escrevo para a mocidade;
Claro, para o bem do legalismo,
E para a defesa da verdade.

Para que se veja novo dia!
Que brilhe nosso patriotismo,
E a tradição da poesia.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Versos desconexos

prefere-se ser
pois o não-ser
é inevitável.

olhando para
essências, vemos
inexistências

é vendo
que se vende
o que se vendava

Gato
Rato
Cão.

domingo, 4 de abril de 2010

Foto e Grafia.

Uma foto deixou-me...
Atrás desta uma grafia.
Deixou-me sem ao menos
Pertencer-me.
Mas a tive nas mãos,
A foto, sim!
Lembro-me do tom claro-carmim
De uma paisagem que nunca vi.
Morros e sorrisos,
Num tom de sol menor,
Triste, porém fingindo.
Uma foto você me deixou.
Me deixou, sem ao menos
Pertencer-me.

Ao início.

De volta ao início de tudo,
Quando encontrei-me aqui.
Mas, tudo já não parece como no início...
Talvez não tenha rompido o espaço-tempo,
Pois leves discrepâncias encontrei.
O que era de cor, descorou
O que era de flor, desflorou
E tudo mais que era, deserou...
Mas mesmo assim, estou
De volta ao início de tudo.

quarta-feira, 31 de março de 2010

Da vida, um Limão.

Se dizes a mim, por acaso,
pirraça ou ilusão:
- Faze da vida um limão!
ou qualquer coisa assim,
é porque tens pena de mim,
e do que recente passei.
Bater no meu ombro e consolar
nada faz, além de me breve-alegrar,
por saber que não estou largado só.
Estou largado em dois.
Dizes do limão e dos afins,
faz analogias fatais,
dignas do acaso praticado.
Agradeço-te mesmo assim,
mas da vida faço o que quero:
Um limão, um cifrão ou uma dor
qualquer amor...
Se vens refutar-me, dizendo:
- Da vida, o que se compara?
Respondo-te então,
com a força de quem mata um dragão:
- A vida a tudo é análoga!
Pois o que vivemos,
é vida.

segunda-feira, 29 de março de 2010

Sem opção

Estás no prato meu,
não me leve assim por mal,
foi no pranto que ai te pus,
sem opção...

Era eu ou você...
Mas você não era sem eu,
tão sem defesa,
e sem razão.

Devia cuidar de você.
O que eu fiz ninguém pode saber!
O meu ventre gritou,
e eu tive que atender!

Quão amargo é,
o gosto de carne da emoção.

Ninguém viu e ninguém reparou.
Assustada, menti que te dei
um Lar novo com muita atenção
mas pra quem, eu já não sei...

Pra rezar ante a refeição,
e chorar tanta falsa gratidão!
Será que vocês vão me perdoar?
Ou pra mim você nunca existiu?

Me alimenta e diz...

Devia cuidar de você.
O que eu fiz ninguém pode saber!
O meu ventre gritou,
e eu tive que atender!

Quão amargo é,
o gosto de carne da emoção.

domingo, 28 de março de 2010

- Por que fazes assim, tamanho escarcéu?
Nada fiz eu a você...
- Diga me o que não foi então?
Quero ver com o teu olhar
O que só fizeste a mim!
-Foi por amor que eu fiz,
Nunca quis
Te ferir!
- Mas feriu!
- Só feri,
Só me afastei de ti
Por carinho
Afeto
Deixei a ti
A vaguidão do nada saber
Só pra não sofrer
- Mas sofri...
- Só sofreu!
E eu? Só te traí,
Por que assim era melhor, só...
- Dó...
- Dó de quem?
- Dó de ti.

quarta-feira, 24 de março de 2010

Sobre bons dias.

Hoje, decidi, é um bom dia pra escrever. É um bom dia para qualquer coisa. Decidi fazer desse dia um bom dia. Afinal, assim me desejaram as primeiras pessoas que vi, logo ao amanhecer. Não me importa se lá no fundo elas desejaram isso, ou falaram apenas da boca para fora, eu desejei que elas desejassem. E o desejo é meu, e deseja assim quem eu desejar que deseje. Então foi decidido. Fiz desse não só um bom dia, mas decidi fazer dele o melhor dia da minha vida. Um ótimo dia. Ai então você vai apontar seu indicador para mim e vai exclamar Ah, mas ninguém te desejou isso, e fará uma cara de triunfo sobre um Golias em ascensão. É. Ninguém me desejou isso. Ninguém quis que eu quisesse desejar que desejassem sem desejar um ótimo dia para mim, e ultrapassando tal barreira, fazê-lo o melhor dia da minha vida. Um ótimo dia? Pra mim? Você, desejando isso? Não creio, quer dizer, sim creio e desejo então que assim deseje! Está feito. Feliz estou. Cumpriram-se minhas necessidades do dia. Do bom dia. Do ótimo dia, o melhor de todos.
É, realmente foi um bom dia, bom dia.

domingo, 21 de março de 2010

Espera aí

Sim, prostrai-vos perante o tempo
aquele que finge as vezes não existir, não sei...
Mas nos faz esperar demais!
Nos tentando enganar com doces casuais.

Não me faça assim de bobo,
não me tome por qualquer gente.
Espera aí, tempo, só mais um pouco,
pra que eu possa ver vida corrente.

Se não for esperar...

Rebelo-me sim, liberto-me a mim!
Ranco os meus relógios das paredes!
Não preciso de ti, pra viver feliz assim,
mas de nós necessitas para pôr em redes.

Sejamos nós tal qual eu!
Esqueçamos então do porvir...
Deixemos o tempo sozinho,
precisando de alguém pra existir.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Fogo

Fogo que esquenta o todo
Fogo que queima o todo
Fogo que se contém

Fogo que está no forno
Fogo que é lenha, fogo
Fogo que levo também

Fogo que cospe fogo
Fogo que cospe o dragão
Fogo que atinge o coração

Fogo que treme todo
Fogo que torra o pão
Fogo que queima a folha que guardava uma canção

Fogo que deixa rubro
Fogo que deixa negro
Fogo que deixa rubro-negro

Fogo que botafogo
Fogo que bota fogo
Fogo que traz um desejo

Fogo que não se vê
Fogo que faz limpar
Fogo que deixa a sujeira

Fogo que queima é fogo
Fogo que lava é novo
Fogo que faz ruir a fogueira

Fogo, é fogo.

quarta-feira, 17 de março de 2010

Injustiça

Já não há justo sobre a terra.
Quão injusto.
Somos tão, tão injustos,
que nos cometemos injustiças.

terça-feira, 16 de março de 2010

Hai Kai (3a edição)

a vida
e como este poema
efemera

Livro

Estou a escrever um livro. Um livreto talvez, um mini-livro, um micro-livro. Mas estou a escrevê-lo. O assunto é mistério, talvez inclusive a quem escreve, mas garanto - ou não - que será bom. Esperem.

segunda-feira, 15 de março de 2010

terça-feira, 9 de março de 2010

Mal me quer

Insensatez
Seria jogar-me em ti, outra vez
Só pela dor de ser só

De vez
Para acabar com o tal do talvez
Fiz então mais difuso o nó

Só, que da flor que fizeste botão
e com a sorte de um reles mortal
contou, me contou

Do amor, só sobrou a corola na mão
E a incerteza da conta cabal
findou, sim, findou

Como podes dizer que sou teu?
Se o que é teu, já pertence a alguém,
que sou eu!

Vá, e procure um sol bem maior
E retire os seus raios também
Pra que o mal,
que me quer,
Vire bem.

quarta-feira, 3 de março de 2010

Para minha sister, Aline.

E o menor se é o mais sincero?
E o maior? Por mais que seja etéreo
Incompreensível, talvez.
Mas se é grande, não quer dizer que é eterno.
Se é pequeno,
o poema,
mas feito com esmero,
De quem nunca me esqueço
Lembra:
Em ti me espelho.
Pois me vejo, sincero.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Novo

Novo.
Novo é difícil.
Ser novo,
ou ter novo.
Tudo te limita
Ao nada saber
De nada.
Se é novo, é inexperiente.
Se tem novo, não se conhece.
Mas fica sempre a certeza
De que sem o novo,
O velho se desvanece.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Sobre ver e enxergar

Deus enxerga,
Olha e vê.
Não como nós
Que vemos,
Mas não enxergamos.
Talvez confundimos,
Enganamo-nos.

Se assim,
Porque é razão
Confiar no que vemos
Mas não enxergamos,
Se quem nós não vemos
Enxerga os nossos anos?

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

#2

Da janela do meu quarto
Vejo o mundo pela metade.
Vejo tudo em um lugar
E nada em outro
Nada, nada.
Então pensei:
Onde estaria a outra metade?
(pois no meu quarto só há uma janela)
Será bonito ou feio?
Grande ou pequeno?
Será coberto por água
(como atlântida),
Ou coberta de ouro?
(como el dorado)

Da janela do meu quarto
Vejo o mundo por inteiro
Mesmo que o inteiro
Seja só pela metade.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

5760 (Parte I)

- Grande bandidagem é ser hipócrita. Todos nós somos, incluindo você.
- Ah meu jovem, fale por si. Bandido? Eu? Nunca!
- Ao menos eu assumo os meus delitos. Nunca cometeu nada de errado? Tens cara de transgressor, velho maldito!
- Pois já os cometi na minha fase ignorante. Agora não mais os cometo! Você é um jovenzinho ousado, crê que sabe de tudo e entende todos! Mas não passa de um idiotinha qualquer.
Era o que ele era. Um idiotinha qualquer. Talvez apenas nos conceitos desse idoso com a mente cauterizada pela própria hipocrisia. Ele se deixara possuir, vendeu-se por um preço fácil. E a hipocrisia dele deixou de ser uma qualidade básica e passou a dominá-lo de forma integral, cegando-lhe os olhos. Ele se achava perfeito. Nada tinha a esconder, exceto o que esse demônio que o dominava acobertava cheio de medo. E o jovem ainda batia o seu pé e matinha a postura: Todos eram hipócritas. E transgressor mor era aquele que tentava escondê-la, era o moralista, o legalista... todos esses. Não havia um homem sequer que não necessitasse de correção. E ele estava prestes a cuspir tudo isso na cara do homem velho, dito mais experiente, que o chamava com toda a sua sapiência de idiota.
- Há, mais você é hipócrita mesmo! Devia ter te acusado antes, mesmo sem provas. Tenho nojo de você, velho sujo. Lógico que comete erros, e tenta escondê-los com a sua hipocrisia, e depois esconde a sua hipocrisia debaixo de uma camada mais espessa de mentiras!
- Cale a boca, Mikhail! Você é o verdadeiro hipócrita. Estás ai, olhando-me de cima, acusando-me como se não tivesse nem um pingo de mentiras em sua boca! Você diz que eu sou maldito, mas não consegue esquecer a desgraça do passado e a esconde da mesma forma! Atrás de uma falácia! Como se não houvesse homem justo no mundo! Como se tudo que todos falassem fosse mentira! Você só não suporta a morte de seu pai!
Mikhail era um jovem de inteligência notável. Nascera em 1930, no décimo sétimo dia de janeiro. Conseguiram se manter anônimos durante algum tempo, mas foram descobertos e mandados para Auschwitz. Sua mãe e ele sobreviveram, mas seu pai não. Morreu com um tiro de um soldado alemão em 44, numa execução digna dos filmes. Mikhail e sua mãe foram libertos no dia do seu aniversário. No peito, a dúvida entre qual sentimento sentir: A alegria por sobreviver, ou a tristeza por se lembrar da perfeita fisionomia do alemão que matou seu pai. Escaparam então, em meio à confusão e pânico, e vieram parar em Niterói, no Rio de Janeiro. Sua mãe se casou em 1946 com Victor, o velho, um profissional liberal meio rico, meio pobre. Mikhail não se agradava dele. Era ele, ele cismava que tinha sido Victor, ou qual nome o pertencesse, que tinha atirado em seu pai. Sua mãe não estava lá para ver, mas ele estava. Ele viu. Ele chorou. E pra compensar, Victor apresentava uma história de passado que tinha cara de inventada, descontínua, Mikhail estava paranóico demais. Era de se entender. Carregava com ele a lembrança traumática de ser o número 5760. Estava escrito na pele. Aos 25 anos, ja havia arranjado trabalho num jornal pequeno. Tinha tino pra repórter e aprendia fácil. Trabalhava de meio expediente, das 6 ao meio dia, e usava o resto do dia para duvidar e desconfiar de Victor, sempre negando o passado que lhe era acusado de ter vivido.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Inspiração

Deixei minha inspiração
no último ônibus que peguei.
Se alguém
por acaso
vir um ônibus colorido e voador, me avise,
Quero de volta o meu gosto.
Quero de volta o meu rosto.

A Felicidade (6 billion others)

Gostaria de começar falando desse projeto sensacional que me emocionou até demais, num momento que me emocionar se tornou difícil. Começo isso aqui de forma bem pessoal e informal, por que acredito que é esse tom que o assunto pede. O Projeto 6 billion others, criado pelo francês Yann Arthus-Bertrand, é de uma sensibilidade inenarrável, buscando o indivíduo e as suas emoções particulares, quando ao mesmo tempo, mergulha nas águas incertas da filosofia e da sociologia visitando diversas visões de mundo. O projeto se hospeda em: http://www.6milliardsdautres.org/, e você também pode compartilhar a sua experiência pessoal, tal qual seus conceitos e filosofias. É um projeto de pessoas, não de massas, e é isso que atraiu o meu olho. Aproxima-se do ser sem dispensar as condições que eles estão inseridos. Apresenta cubanos, suecos, nigerianos, chineses, indianos, estadunidenses, franceses e muitos outros. Pude ver a parte na qual as pessoas discorrem a respeito do conceito de felicidade. Segue o vídeo, e não me atrevo a dizer o que é a felicidade pra mim.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

;~

Cansado e sem tempo, dei-me aos pequenos poemas com sentidos óbvios. Amo fazê-los. Isso está se tornando cada vez mais divertido e menos pesaroso. Não que eu odeie os grandes e sofridos que fiz, amo-os da mesma forma. Mas é que por esses tempos estou sem tempos para sofrer, e pensar, e amar, e viver o suficiente para escrever e tudo o mais. Atualizarei mais dentro de tempo.

O tropeço

Trôpego tropeço
Tratos como trapo
Maus tratos
Com o trôpego transeunte
(ah, se ele tivesse extratos!)
Que há travessava
A travessa transparente
Com traços de pranto
Beba dor.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Se eu pudesse fazer
da sinestesia algo real,
Expressaria nesse poeminha
De uma nota,
Uma nota só.
Pra poder entender
O dó.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Sem você sou pá furada!

O velho e a peste.

É, fui arrastado. Minhas unhas arranharam o chão. Não queria sair de Niterói. Ainda mais agora... vir pra Cabo Frio? Tenho 85 anos(mesmo que mentais) e só saio de Niterói por vontade se for por um velho amigo, ou pra ir até a Tijuca. Ah, sim, a Tijuca! Tanto ufanismo e eu não sei nem por que. Mas lá eu encontro meu lugar. Quero morrer onde nasci. Mas cá estou, Cabo Frio. Arrastado e tedioso. Não há velhos amigos aqui. Estou passando o tédio de ficar trancado em um apartamento na cidade que dorme tarde. Abriga os jovenzinhos com suas roupas multicoloridas e demasiadamente estampadas, quando alguns pseudo-literatos carregam seus crepúsculos e luas novas por onde vão. Esses jovens, nunca vi! Reclamando de mim, dizem que não tenho gosto de viver... É por que a vida deles ainda é doce. A minha já foi, na Tijuca. Mas encontrei um refúgio num pequeno centro comercial perto da minha cela, e aproveitando do meu regime aberto me encontrei numa loja de livros. Maravilha, agora sim, algo de bom. Comprei-me um livro novo, estava desprovido deles. Mal eu sabia onde o determinismo ia me levar. Levei Albert Camus, no romance "A Peste". "Aí sim", pensei, erradamente. Me desloquei até uma pequena praia, pela calma diria eu um canal, que por brincadeira de ótimo gosto do horizonte, fundia seus montes e mais parecia uma lagoa de pequenas ondas que aumentavam de força e frequência a medida que passava uma lancha ou escuna. A faixa de terra era longa, porém estreita. E eu encontrei paz e ventos bons encostando-me no que fora um dia uma rede de voleibol. Paz, por pouco tempo. Maldita superficialidade! Entraram em cena um marido mandado e uma loira semi-obesa, que tentava tirar fotos de nível profissional. Dava ordens incessantes ao marido calado. Só isso pra tirar minha paz. Li sem entender nada o primeiro capítulo do meu livro. Resolvi me levantar pra ir, e a gorda resolveu que também queria ir na mesma hora que eu por sarcasmo do destino. Me irritei e procurei a primeira futilidade que me veio à vista. Pronto. Estou nessas casas de computador (como é que esses jovens chamam hoje em dia?) escrevendo.