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Nem sempre sou quem escrevo, mas sempre sou quem escreve.

domingo, 30 de maio de 2010

Concha

E eu mais uma vez
me fecho na minha concha
jurando que não abro mais.
Pra ninguém.

sábado, 29 de maio de 2010

Era uma vez

Pais irresponsáveis
que queriam que o filho aprendesse
a mentir.

Quando ele cresceu
e os pais já haviam passado toda
a experiência,
Perguntaram-no:
- Filho, aprendeu a mentir?
E ao que o filho respondeu:
- Não mamãe.
Perceberam que foram muito
bem sucedidos.

O pai no entanto,
duvidou ser verdade a mentira
e perguntou:
- Aprendeu mesmo a mentir?
E quando ele respondeu:
- Sim papai.
Os dois viraram cabide.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Aventura

Branco tinha uma vida ordinária
Um carro popular
Uma conta corrente secreta
Uma amante e dois filhos
Um homem e uma mulher
Tinha passado no vestibular
Tinha terminado a faculdade
Entrado num emprego ordinário
Ganhava um salário normal
(até mais do que deveria)
Comprou tudo usado
Inclusive a sua esposa
E com esta tinha brigas normais
Com as mesmas palavras ordinárias
- ordinária! -
E o mesmo fim água-com-açucar
que logo salgava
Mas de repente
Branco morreu.
(De forma ordinária.)

Não dá

Falta
Privacidade nas idéias.
Todo mundo tá me vendo.
Assim não dá pra ser
Poeta.

domingo, 23 de maio de 2010

Auto Sugestão

Eu boto açúcar na água
E deixo a imaginação gritar:
Suco de Limão.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

O riso

Eu ri.
Ri por necessidade.
Ou por falta de qualquer esboço
de sentimento, sem esforço brutal.
Aquele riso, que se dá
mas se toma logo após.
Rir: tapar a dor atroz.
Que há assim no nós?
O passado que não muda.
Choro. O riso de vera.
Eu só ri.

Você riu.
Riu por cinismo.
Ou por falta de compaixão,
sabendo o dia que chorei então.
Aquele riso, que se empurra
goela abaixo de quem tímido sorri.
Rir: É só pensar em si.
Que há assim no nós?
O passado que não importa.
Choro. O motivo do teu riso.
Você sorriu.

domingo, 9 de maio de 2010

Pingos nos is

Triste foi o dia em que eu fui desabar.
Ah foi... sim.
E eu já sabia que essa hora ia chegar:
Nada mais me prendeu,
Pois tudo me pesou,
E assim fui a primeira na corrida pra bater
No chão.

Não há pr'onde correr,
No breu dessa dura pavimentação.
Contento-me em esperar,
Subir e ficar
Latente numa nuvem clara de verão.

E assim vou, me explicando,
Repetindo, Retornando.
Espero que esteja assim
Claro, pra você.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Re-fórmula

Há de se querer
Pode-se esquecer
o céu
(sim o Tal, infindo)
Esquece-se sim
Há de ser perto
E terno não se vende

Basta se querer
e não querer a si
Crer se assim
Puder.

Quão lindo é.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

15 de maio em Icaraí

(Um ano após a separação)

Cláudio:
Parece mais jovem.
Mas isso não te faz mais bonita.
Talvez. Não sei.
Ah, também não quero saber...
Alguém sabe? O que?
Mais jovem foi que me juntei
com você, Fabiana.
E eu olhei você daqui,
mais velho, agora.
A andar calçadão afora,
como quem nada quer
pois tudo tem.
Tenho eu tal andar também?
Pra ti? Não sei.
Ah, também não quero saber...
Alguém sabe? O que?
Um ano depois.
Dos dez anos atrás,
Será que já tens alguém?
Será que me traria a paz?
Ou outra senhora quererá matar,
Pela dor do nosso brigar?
Morri? Não sei.
Ah, juro que quero saber...
Alguém sabe? Por que?
Me queixo de tão bobo ser.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Teimosia

Teimosia é
fazer o que se quer
de refém:
Ou morre apenas você,
ou se vai o que se quer também.

sábado, 1 de maio de 2010

A guerra

(Fabiana joga a urna, com as cinzas da avó de Cláudio, da janela do décimo quinto andar do prédio.)

Cláudio:
Por que fizeste tal coisa?
Estás a delirar? Já deveria saber:
Me casei com uma louca varrida!
Completamente possessiva!
Concedi o meu domingo,
minha missa, meu futebol,
minha motocicleta, meu anzol,
minhas palavras, minhas cervejas,
minhas amigas, minhas certezas,
muito mais que meu tudo te dei!
Pra saber que me enganei!
Agora me privas do que restou de minha vó,
aquela santa, tão diferente de vossa mãe!
Jogou-a do décimo quinto andar...
Pra o que restou dela, não mais restar.

(Ouve-se um grito distante, e os dois parecem não se importar com aquilo, e continuam a discutir. Fabiana rasga a capa de um vinil do Elvis Presley, e lança o disco de encontro à parede, que se quebra em mil pedaços)

Fabiana:
Santa? Santarrona!
Maldita pecadora
era a vossa progenitora!
(Fabiana pega o disco "Abbey Road", dos Beatles. Num rápido movimento, Cláudio corre para se entrincheirar atrás do sofá novo.)
A tua família foi concebida
na prostituição! E você?
Te encontrei a vadiar pelo Grajaú!
(Nesse momento, Cláudio deixa a cabeça aparecer atrás do sofá, com a expressão raivosa)

Cláudio:
Vá tomar no...
(O barulho do vinil dos Beatles espatifando um vaso de porcelana abafou a última palavra dita por Cláudio. Nesse momento, Fabiana corre até a cozinha e pega um Pudim de Chocolate, e com a fôrma em punho, volta para a sala.)

Fabiana:
Olha cá, o pudim que te fiz!
Há duas semanas está na geladeira...
Não gostas de comer besteira?
Então, tome-as!
(Fabiana pega punhados de pudim e os lança aleatoriamente. Agora Cláudio está realmente bravo, e de sopetão vira o sofá de ponta a cabeça. Sua cara está vermelha. Ouve-se um som de sirene ao fundo.)

Cláudio:
Não te bato pois fui educado!
És uma mulher insolente!
Vadio é quem diz, pois você não trabalha,
fica em casa o dia todo,
vai a academia, malha,
volta pra casa e se deita no chão.
E não pense que não sei do Ricardão!
Pois aquelas gravatas que surgiram
no armário, não eram minhas!
Enquanto eu estou a trabalhar,
onde já se viu?
Ausento-me para te sustentar,
e tens a ingratidão de me trocar?
Desgraçada tu és,
Fez do meu amor castelo de areia,
na beira do mar.
Já se foram dez anos,
e só nos cinco primeiros
te pude aguentar!

Fabiana:
Te traí por que assim também o fizeste!
Achei que estava subentendido...
Tácito, implícito!
As várias que tens nas ruas,
conheço-as por nome e cor,
qualidade de cabelos e estilo,
e por muitos outros mais eu sei
das tais do teu harém.

(Na rua, uma senhorinha estava morta, com paramédicos a colocá-la na ambulância, e como a viatura obstruiu uma passagem, um motorista descuidado e alcoolizado bateu em outro carro. Fabiana e Cláudio ouvem o estrondo da batida e correm juntos até a janela, avistando a senhorinha, coberta com as cinzas da avó de Cláudio, e os paramédicos desnorteados.)

Assim terminou a batalha:
Cada um foi pro seu canto
Sem ter o que falar
Diminuiu-se à um diminuto pranto,
simultâneo.
Cláudio dormiu no sofá.