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Nem sempre sou quem escrevo, mas sempre sou quem escreve.

sábado, 17 de julho de 2010

O Banco Alto

De todas as coisas no mundo que me dão pano pra manga, a maior de todas elas, indubitávelmente é um ônibus. Porque no ônibus eu tenho os meus insaites, tenho as minhas idéias. A Pendotiba, empresa que monopoliza o transporte público aqui de Niterói, já partilhou das minhas maiores alegrias, das minhas menores tristezas, dos meus pensamentos, das minhas decisões. Não sei o que seria se andasse de táxi. Não seria o mesmo. Tive idéias, tive falta delas, li, amei, cuspi, ri, chorei, tudo dentro de um ônibus. Mas tudo isso não é nada, diante da tamanha importância que os ônibus têm em minha vida.

Foi hoje que eu vi, e me lembrei. Pegava o ônibus para a escola, para ir me preocupar com notas e recuperações, quando entraram porta adentro uma mãe, e seu filho, de uns 8 anos, e ela o carregava por obrigação. Não era daquelas crianças que anda subordinadamente ao lado da mãe: ele deveria ser literalmente puxado. Eu estava sentado no assento mais alto, aquele assento que é elevado por causa das rodas do ônibus. Havia entrado no ônibus e me dirigido diretamente a esse assento. E a criança, arrastada, soltou um grito no meio do ônibus:
- Ali mãe! Ali! No banco alto! EU QUERO SENTAR NO BANCO ALTO!

Voltemos aos dias de minha infância:
- Ali mãe! Ali! No banco alto! EU QUERO SENTAR NO BANCO ALTO!

Sim, eu também queria, e ainda quero, todas as vezes que entro no ônibus, sentar no banco alto. Mas por que?

POR QUE PREFERIMOS O BANCO ALTO?!?
Nunca entendi. E em meio a tantos risos, choros, amores, ódios, cuspes, escarros, leituras e devaneios eu sempre me perguntei isso. E é o banco alto, e de preferência o da janela, que dá pra encostar a cabeça e sentir os respingos e o vento. São 18 anos de dúvida. Talvez seja uma questão de vida inteira, uma monografia de mestrado - que defenderei com unhas e dentes. Isso tudo me atacou hoje e me levou até o Gúgôl. "Por que preferimos sentar no banco alto do ônibus?" foi o que eu perguntei ao Dr. Sabe tudo, e do alto da sua sabedoria ele me mostrou que eu não estava só. Comentários e mais comentários, reais e ficcionais, a respeito da preferência pelo tão aclamado assento. Muitos comentários, muitos relatos, mas nenhuma resposta. Isso é caso de pesquisa antropológica, não brinco aqui caros leitores. Talvez seja pelo desejo humano de destaque, ou pelo mesmo instinto natural de estar numa posição privilegiada, que te permite avistar melhor o ambiente que te cerca, cheio de riscos e ameaças. Eu sento por nostalgia. Por falta do que fazer, gosto de coisas que me lembrem dos meus 5 anos. Mas não é só por isso, a vontade arde, quando vejo o banco vago, a janela vaga, sem ninguém do lado! Tomo o assento e me acalmo. Mas se não há mais lugares nesses mirantes do transporte público, fico um tanto desapontado. Dá até vontade de falar:
- Ali, no banco alto. Queria sentar no banco alto.

Estarei fora pelas próximas duas semanas. Sei que não farei falta, mas é só pra avisar mesmo.

5 comentários:

Tiago Duarte Dias disse...

Eu também sento no banco alto, e fico mal quando ele já está ocupado.

Carol da Matta disse...

Daniel, quanto ao gênero do que escreveu, trata-se de uma Crônica. Você parte de uma observação factual da realidade e, ao longo do texto, segue para uma reflexão maior. Há, além de sua visão acerca do tema, o traço narrativo do texto.
(Porque você escreveu no twitter que não sabia o gênero, rs). Boa crônica!

Ônibus já me renderam boas histórias e vivências. Mas o banco alto nunca foi meu preferido. Sento-me SEMPRE que posso do lado direito, no canto, no banco que fica bem no meio do veículo e que tem a janela perfeita: aquela que abre bem no rosto. Gosto de ver o que anda lá fora e do vento, como você.

mari_aylmer disse...

Banco alto rocks!
hahah
=]
Blogueiro carente, que nem eu!
rs!
bjs

Stefan Rotenberg disse...

Eu talvez seja um comentador interessante. A minha irmã, que nessas coisas foi 'construída' de forma bem semelhante a mim, nunca senta no banco alto. Eu passei a sentar de uns tempos pra cá. Sem me estender nas diferenças entre o que eu fiz de mim e o que minha irmã fez dela, dá pra dizer bem claramente que o que me motiva e motivou a sentar no banco mais alto é um sentimento de agressividade. Não aquela agressividade entendida como violência, mas aquela outra, que talvez só eu use, que denota as ações explosivas, 'pra fora'; de curiosidade; de movimento; de conquista do mundo. In the hall of the mountain king. O rei da montanha, o rei do ônibus - o mais alto, o que tudo vê, o que todos observa. É muito bom saber que há tantos por aí carregando, desde a infância, esse sentimento de curiosidade e interesse pelo mundo. Ficarei menos triste na próxima vez que vir o tal banco perfeito ocupado.

Milena Leão disse...

Sem dúvida o ônibus é quase que meu atelier favorito, afinal de contas é um dos maiores exemplos de não lugar que eu conheço.

Mas sobre o banco alto, eu assumo, quando o procuro, é pura e simplesmente para satisfazer o meu ego.