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Nem sempre sou quem escrevo, mas sempre sou quem escreve.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Os dez anos de Otávio

1
Otávio
Acordou um dia,
Sem acordar.
Tava tudo escuro.
Otávio de repente,
Percebeu-se cego.
Perdeu o que mais gostava:
Os desenhos, as imagens,
Videar a vida.
Perdeu o fusca, a sua casinha,
Diogo, o cão,
A ruazinha de terra,
E papai e mamãe.
Mas não ficou muito preocupado,
Talvez por não entender,
Talvez por ter um presságio.
Tudo que dorme, acorda!

2
Otávio, dez anos depois,
Acordou de vera.
Esfregou os olhos
E pôde ver enfim.
Mas não poderia recobrar tudo:
Não havia mais fusca, e agora morava num arranha-céu,
A cidade corria,
Diogo tinha ido, e o cão havia
morrido.
E papai e mamãe
(Irreconhecíveis!)
De cabelos brancos
E rugas na cara.
Mas não ficou muito preocupado,
Talvez por entender demais,
Talvez por ter uma certeza,
Tudo o que acorda, dorme!

Um comentário:

Carol da Matta disse...

Lembrou-me de modo muito inocente o "ensaio sobre a cegueira" do saramago. Algo como: é preciso estar cego para realmente ver.